A ANECRA organizou em Coimbra a edição 2025 do “Encontro Nacional do Comércio de Automóveis Usados” que foi, a exemplo das anteriores edições, muito concorrida. Desta reunião, destaque para o recente inquérito de conjuntura que demonstrou que 27% das empresas apostam na criação de oficinas com porta aberta como forma de diversificarem as fontes de receita.
Sob o mote “Sector Automóvel – Mobilidade mais Sustentável”, o “Encontro Nacional do Comércio de Automóveis Usados” reuniu profissionais e entidades de referência de todo o país: bancos, financeiras, grupos de retalho automóvel, gestoras de frotas e grandes operadores, bem como empresários e gestores do sector automóvel, num ambiente de partilha e reflexão. Ao longo do dia, foram debatidos alguns dos temas mais relevantes e estratégicos para o futuro do sector automóvel em Portugal, num momento de particular exigência e transformação.
No primeiro painel, sobre o tema “Os Desafios de um Sector mais Regulamentado e mais Regulado”, que contou com a moderação de Pedro Nuno Ferreira, Professor da AESE Business School falou-se da regulação e do cumprimento de regras no segmento do comércio dos automóveis usados.
Relativamente ao “Combate ao Branqueamento de Capitais”, João Rodrigues Brito, Managing Associate da Morais Leitão referiu que “os Comerciantes do Sector Automóvel necessitaram de se adaptar: esta área de negócio pode ser um veículo condutor de valores com origens ilegítimas”, sendo que atualmente há uma maior consciência relativamente ao combate à criminalidade económica e financeira e à necessidade do cumprimento de regras.
Nesse âmbito, existe a obrigatoriedade de formação específica e da existência, nas empresas, de um Manual interno de prevenção: trata-se de uma forma de estabelecer normas e procedimentos que os Comerciantes têm valorizado, tornando-os mais capacitados para o cumprimento da sua função. Carlos Loureiro, Inspector da Unidade Nacional de Operações da ASAE fez um apelo à importância das relações que deverão ser de confiança entre as empresas e os clientes, eliminado riscos reputacionais para os empresários.
Relativamente ao tema da concorrência desleal, a ANECRA, através do seu Secretário Geral, referiu que tem vindo a apresentar várias propostas às entidades competentes, com o objetivo de prevenir e combater esta prática de forma mais eficaz.
Na sua intervenção, José de Athayde Tavares, Managing Partner da José de Athayde Tavares & Associados, sublinhou que “os abusos originam situações de concorrência desleal, e que a intervenção das entidades fiscalizadoras se depara, em alguns casos, com a ausência de um enquadramento legal adequado — isto apesar de vivermos num país com uma clara tendência para a hiper-regulamentação, o que, paradoxalmente, muitas vezes se revela contraproducente.”
Já o processo de importação de viaturas obedece a um conjunto de exigências legais, Marcos Dias, Responsável pelo Gabinete Economico-Fiscal da ANECRA, refere que a Associação “promove um conjunto de boas praticas junto dos seus Associados e reforça que ter o máximo de informação sobre a viatura que se pretende adquirir é essencial, assim como manter o canal de informação aberto, mesmo depois da venda efetuada, para solucionar todos as questões que possam surgir”.
Quanto à nova Lei das Garantias, esta continua a representar um constrangimento significativo para os operadores do setor. Na sua intervenção, Roberto Gaspar, Secretário-Geral da ANECRA, destacou que este tema tem sido sistematicamente levado à discussão nas reuniões mantidas com os sucessivos Governos, com o objetivo de alertar para a necessidade urgente do seu reajustamento, em linha com a realidade do mercado.
A ANECRA defende que esta revisão deve garantir relações justas, equilibradas e adequadas, salvaguardando os interesses e os direitos tanto dos consumidores como dos comerciantes.
O Financiamento Automóvel
Já no segundo painel de discussão sobre “O Financiamento Automóvel”, também, com a moderação de Pedro Nuno Ferreira, falou-se do impacto que tem vindo a ter a flutuação das taxas de juro em toda a cadeia de negócio e do que poderemos esperar até ao final do ano. Segundo Paulo Jorge Figueiredo, CCO, Board Member da COFIDIS Portugal, “as taxas de juro têm vindo a descer, sendo o fator mais importante a sua imprevisibilidade”, o que leva à incerteza do mercado. João Mendes, Managing Director do Santander Consumer Finance aborda, também, a instabilidade do mercado, mas refere a importância de olhar para o futuro com confiança. Na mesma linha, Henrique Henriques, Director Comercial do Banco Credibom refere que a estabilização das taxas de juro estão a criar um sentimento de otimismo, levando à maior procura de viaturas.
Licínio Santos, CEO do Montepio Crédito reiterou o sentimento de confiança relativamente à atualidade do sector, apresentando números de crescimento do financiamento automóvel: mais 10% em viaturas novas e mais 8% em usadas. Diogo Lopes, Head of New & Used Car Sales do CETELEM BNP Paribas afirmou que “é expectável alguma estabilidade nas taxas de juro o que é benéfico para o negócio”. No âmbito deste painel, foi também debatido o impacto crescente das plataformas digitais e dos marketplaces, assim como a possibilidade de o futuro do financiamento automóvel vir a depender, de forma cada vez mais significativa, destes canais de promoção e venda.
As entidades financeiras presentes sublinharam que, sendo o Mercado Automóvel um Setor altamente dinâmico, este exige dos seus players uma constante capacidade de inovação, nomeadamente no desenvolvimento de novas soluções. Nesse contexto, destacaram a importância crescente da componente digital, mas alertaram que esta não deve, em momento algum, fazer esquecer o valor da dimensão humana, essencial para reforçar a relação de confiança com os clientes.
Dados e Tendências
Na palestra sobre “O Mercado – Dados e Tendências”, com Daniel Rocha, Head of Mkt & B. Intelligence da OLX Motors foi referido que “houve um crescimento da procura nos primeiros meses deste ano face ao ano passado, seguindo-se um abrandamento. Esta intervenção serviu de transição para o terceiro e último painel do dia, subordinado ao tema “Os Desafios Imediatos do Comércio de Automóveis Usados”, que contou com a moderação de Roberto Gaspar. Durante este painel, foi abordada a atual evolução da procura neste segmento.
Américo Barroso, Vice-Presidente da ANECRA e Administrador da Só Barroso, partilhou a sua perspetiva, referindo que neste momento a procura se mantém relativamente estável. Por sua vez, Pedro Bastos, CEO da Pedro Bastos Car Consulting referiu que “o mercado do luxo está sólido e em expansão”. Para Gentil Pereira, Director Geral da Carplus “o mercado de novos tem passado um período menos favorável, abrindo oportunidades ao mercado das viaturas usadas”. Quanto a viaturas elétricas nota-se uma maior procura, começando-se já a fazer algum stock destas viaturas, ainda que de forma controlada. Já Tânia Azenha, CFO da Hemoauto – Azenha & Gonçalves, considera a desvalorização de veículos elétricos maior e, por isso, considera existir um risco elevado na eventual acumulação de veículos elétricos em stock.
António Machado, Remarketing B2B Sales Manager da Ayvens Portugal, maior operador de Ramarketing em Portugal, referiu que as viaturas que tem para colocar no mercado são maioritariamente provenientes do mercado empresarial, tendo as viaturas eléctricas e electrificadas um número bastante expressivo, o que torna a sua missão desafiante, uma vez os operadores de usados nem sempre estão disponíveis para fazer stock deste tipo de viaturas.
Um dos temas mais sensíveis abordados neste painel centrou-se na recente alteração do modelo de pricing do Standvirtual, o marketplace líder no mercado nacional.
Esta mudança gerou significativa contestação e instabilidade no setor, especialmente nas semanas que antecederam este encontro promovido pela ANECRA. Quando questionado sobre o tema, Nuno Castel-Branco, CEO do Standvirtual, esclareceu que a alteração decorreu de um processo de alinhamento internacional da plataforma. No entanto, reconheceu o impacto que a nova política de Pricing teve no mercado português e explicou que, perante esse cenário, foi iniciado um processo de auscultação e diálogo com os principais stakeholders nacionais — com destaque para a ANECRA, que desde o início manteve uma postura construtiva, de diálogo permanente e de procura ativa de soluções em nome dos seus Associados.
Desse processo resultou a implementação de um conjunto de medidas corretivas, que permitiram mitigar de forma significativa os principais desajustes detetados na versão inicial do novo modelo. O resultado é um sistema mais equilibrado e mais ajustado à realidade do mercado nacional, respondendo de forma mais próxima às expetativas dos empresários do setor.
Alexandre Ferreira, Presidente da Direção da ANECRA deu as boas-vindas a este evento que contou com um enquadramento ao sector automóvel de Roberto Gaspar, onde ficou claro que o segmento do comércio dos automóveis usados tem vindo a ganhar importância significativa, estima-se que valha cerca de três vezes o mercado de novos.
Segundo um inquérito de conjuntura da ANECRA, realizado a mais de duas centenas de empresas, relativamente a viaturas importadas, 40% das empresas refere que trabalha com viaturas usadas, sendo que 60% não trabalham com viaturas importadas. Facto que merece destaque, uma vez que as viaturas importadas tiveram durante muito tempo um estigma, que fazia que a maiorias dos operadores evitasse recorrer a este tipo de produto.
Novas fontes de receita
Ainda no âmbito do recente inquérito de conjuntura, a ANECRA procurou compreender que outras atividades ou fontes de proveito estão a ser exploradas pelas empresas de comércio de viaturas usadas que participaram no estudo. Relativamente a novas fontes de receita, destaca-se que 27% das empresas apostam na criação de oficinas com porta aberta e 17% oferecem serviços de lavagem de viaturas, como forma de diversificar o negócio e aumentar a rentabilidade. No que diz respeito aos principais desafios do sector, 48% dos operadores identificam a falta de pessoal qualificado como o maior constrangimento, seguido pelos custos associados à promoção digital e pela extensão das garantias automóveis, ambos apontados por 38% dos inquiridos. Quanto às perspetivas de negócio para 2025, 48% dos inquiridos acreditam que o próximo ano será melhor que 2024, prevendo, entre outras coisas, um aumento do stock disponível para comercialização
Do Encontro Nacional do Comércio de Automóveis Usados, um dos principais momentos associativos da ANECRA, é parte integrante um almoço que representa uma oportunidade de excelência para a expansão da rede de contactos num espaço de networking e confraternização.