A ARAN promoveu na Póvoa de Varzim a conferência “O Futuro do Retalho Automóvel” onde reuniu alguns importantes especialistas nacionais e internacionais. Aqui estão as conclusões.
O setor automóvel deve de preparar-se para a adaptação ao novo paradigma de utilização de veículos que está em surgimento. De necessidade de carro, os consumidores irão passar a ter necessidade de transporte. Essa realidade é potenciada, de resto, com outra alteração de fundo, a da tecnologia dos veículos (propulsão) e nos veículos (conectados com recurso à Internet e à telemática).
Os especialistas presentes na conferência “O Futuro do Retalho Automóvel”, que a ARAN promoveu, em parceria com o CEGAA (Conselho Europeu dos Grupos de Agentes do Automóvel), na Póvoa do Varzim, alertaram que os operadores do retalho e do pós-venda têm de estar atentos a essa realidade, mas salientaram, por outro lado, que continuará a haver necessidade do presente por algum tempo no futuro.
Jean-Charles Herrenschmidt, presidente do Conselho Europeu do Comércio e da Reparação Automóvel (CECRA), representante ao mais alto nível do setor em Bruxelas, admite que há ameaças para o retalho, mas acredita que também haverá oportunidades.
Logo no arranque da conferência, o presidente da ARAN, António Teixeira Lopes, tinha dado o mote para a análise SWOT que o encontro poderia ser. “Não vamos ensinar nada nesta conferência, apenas queremos despertar consciências e fazer uma análise SWOT ao setor, detetando ameaças, mas também oportunidades”, indicou.
O secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches, que presidiu à abertura do evento, salientou a capacidade de Portugal em termos de disponibilidade para a mudança energética dos automóveis. Salientou que, à hídrica e eólica, o país está a juntar a energia solar.
Dentro do setor automóvel, uma das áreas com uma grande mudança em curso é a forma de financiar o veículo. “Essa mudança, combinada com a alteração que também está a acontecer no setor financeiro, é um duplo desafio para nós”, referiu o CEO da Santander Consumer Portugal, Henrique Carvalho e Silva.
“A Nissan tem como visão um duplo zero: zero emissões e zero fatalidades”, explicou António Pereira Joaquim, diretor de comunicação da Nissan em Portugal. A marca japonesa é, recorde-se dos construtores que mais aposta na mobilidade elétrica. O LEAF, modelo elétrico, vai ter, já este ano, capacidade de condução autónoma Fase 1 (em algumas circunstâncias em autoestrada), de acordo com a mesma fonte.
O presidente da Associação Portuguesa de Leasing, Factoring e Renting (ALF), Paulo Pinheiro, salientou, por seu turno, que “estão reunidas as condições para a alteração do paradigma automóvel”. A mesma fonte avisa que há problemas a resolver, desde logo com a propriedade da informação nos veículos conectados. “Quem vai ser o proprietário da informação? Poderei ir a uma oficina multimarca?”, questiona Paulo Pinheiro. “Há alguns anos para adaptação”, acrescentou o presidente da ALF.
Thomas Chieux, da consultora ICDP, salientou que as vendas dos veículos, mas também através dos veículos irão, certamente, mudar a face do setor automóvel. O especialista destaca a telemática e as aplicações da Apple e da Google. “Os consumidores terão, no futuro, oportunidade de comprar algo que não apenas um carro”, disse.
Antje Wolterman, vice-presidente do CECRA, referiu que a digitalização está a afetar vários setores e o automóvel não é exceção. “Estão a entrar em cena novos modelos de negócio. Nem todos vão ter sucesso, mas há que estar atento ao que é feito”, salienta a mesma responsável, para quem é tempo de discutir os elevados investimentos em espaços de exposição física que as marca sugerem aos concessionários de automóveis.
Do ponto de vista do pós-venda, “os elétricos ainda não são uma questão para o pósvenda”, de acordo com Guillermo de Lera, da consultora GiPA. O especialista recorda que, no presente, são 3% das vendas e 1% do parque automóvel.
Cliente final sem decisão
Tanto na venda como no pós-venda, o cliente final terá um menor peso no futuro, de acordo com Ricardo Conesa, da ICDP, que avisa que o setor automóvel vai passar de B2C para B2B. “Quem decide e como decide está a mudar. Claro que não está a acontecer de um dia para o outro, mas a mudança está a acontecer”, disse Conesa.
Mafalda Ferreira, docente do IPAM especialista em perfis de consumidores, alertou para a mudança dos perfis. “Os consumidores já não são só ‘consumers’. Em muitos casos, são ‘prosumers’, assumem-se como líderes de opinião”, disse.
Patrick Lautard, da consultora Osea, colocou a tónica no otimismo. “Conheço o setor oficinal há 30 anos e este foi sempre capaz de adaptar-se”, salientou. “O futuro não é tão negro como o pintam”, explicou. O investigador e consultor do setor automóvel John Kiff salientou que a tendência é “haver cada vez menos automóveis vendidos pelo método tradicional”. Kiff indica que, do ponto de vista das empresas do setor, os clientes serão, “mais do que comprador de carros, compradores de solução de transportes”.
Trevor Jones, da ASE Consulting, avisou que “haverá mais mudanças no setor nos próximos 15 anos do que nos últimos 100”. Sobre o tipo de propulsão, o consultor não destaca os elétricos, para já. “No futuro próximo, a grande questão são os diesel”, referiu Trevor Jones.
Legislação futura
O deputado ao Parlamento Europeu João Ferreira salienta a importância dos legisladores nacionais e comunitários estarem atentos às novas formas de comercialização automóvel. “A mudança de realidade está a ser rápida. Quanto maior a desigualdade entre os vários elos da cada, mais tem de ser o poder político a liderar a mudança”, avisou o eurodeputado.
O diretor-geral das Atividades Económicas, Artur Lami, salienta que os “novos modelos de negócio são disruptivos para toda a gente: Governos, União Europeia e setores tradicionais, mas também retalhistas e reparadores automóveis”.
“A questão está na adaptação. Não há receitas milagrosas”, realçou Artur Lami.
No fim do evento, António Teixeira Lopes expressou uma palavra de otimismo e solidariedade para com os retalhistas, presumivelmente quem serão mais afetados pela mudança por que o setor está a passar.
Conclusões ARAN