Sendo uma das empresas mais antigas do aftermarket de pesados em Portugal, a HBC foi pioneira em muitas das estratégias que atualmente se aplicam no setor. A empresa continua a modernizar-se a pensar cada vez mais no futuro.
ENTREVISTA PAULO HOMEM
Com uma forte posição no mercado português de peças para veículos pesados, a HBC tem vindo a reestruturar a sua atividade ano após ano. Alguns recentes investimentos levam a empresa para novos desenvolvimentos, com vista à sua modernização do ponto de vista operacional, como nos conta João Cordeiro, Administrador da HBC, nesta entrevista à revista PÓS-VENDA PESADOS.
Como é que hoje caracteriza a HBC?
A HBC dedica-se atualmente ao negócio de peças para pesados, para todas a marcas de camiões, sendo esta a nossa principal quota de mercado, temos também vindo a dar alguns passos nas peças para autocarros, que têm vindo lentamente a assumir algum destaque, ainda que a representatividade do mesmo no nosso volume de negócios é ainda pouco significativa.
Quer isto dizer que começaram a investir nas peças para autocarros?
É uma área muito específica. Por exemplo, nesta área não existem os catálogos que, por exemplo, existem nas peças para camião. Sabemos que ao nível do chassis e da mecânica não existe grande diferença para o camião, mas ao nível da carroçaria e climatização são áreas onde existe pouca informação e são muito específicas, onde existem também operadores com muito know-how dessas áreas. O que trabalhamos para autocarro é sobretudo as peças de chassis e de mecânica.
O vosso negócio esteve muito associado às peças usadas?
Hoje as peças usadas, reconstruídas e a oficina representam menos de 10% do nosso volume de negócios, sendo o restante valor de faturação peças novas. A empresa começou há mais de 30 anos pela venda de camiões usados importados, depois houve necessidade de ter uma oficina, depois vieram as peças usadas e só depois as peças novas. A verdade é que todas estas áreas têm crescido, mas o grande crescimento foi mesmo nas peças novas. Historicamente sempre houve uma associação à marca Scania, mas nos últimos oito anos houve uma grande diversificação para outras marcas, nomeadamente para Volvo, Renault. A Scania representa 50% da nossa atividade atualmente, se juntarmos Volvo e Renault já falaremos em cerca de 80%, ficando os restantes 20% para as outras marcas.
A estratégia é equilibrar o peso de cada marca dentro do vosso portfólio de peças?
A realidade do aftermarket não é propriamente a realidade que existe nos camiões novos. A nossa grande fatia de aftermarket são veículos com mais de 6 anos e menos de 20 anos. A maioria dos nossos clientes de transportes internacional renova as frotas de tratores aos cinco ou seis anos e muitos desses veículos desaparecem do mercado. Os veículos que se mantêm mais anos são os veículos específicos (autocarros, camiões do lixo, camiões de obras, etc.).
Quais têm sido as principais apostas que têm levado a uma grande modernização operacional da HBC?
Temos evoluído muito na área das peças. No início do ano investimos num novo sistema informático que nos permite não só ter uma noção daquilo que vendemos, mas sobretudo daquilo que não vendemos. Desta forma já conseguimos ter uma noção mais exata das vendas, das consultas e das não vendas. Neste caso, das não vendas, já podemos analisar qual foi a razão da não venda, isto é, se não havia stock, se o preço está mal posicionado, se houve erro na identificação, etc, o que nos permitiu subir alguns patamares em termos de CRM face ao anterior sistema. O investimento no software de ERP teve também a ver com a parte das peças usadas desde o momento que chega um camião para desmantelar. Conseguimos rastrear todos os componentes e peças usadas que são retirados do camião e saber qual a rentabilidade que nos trouxeram após a sua venda. Atendendo que as peças novas estão com margens cada vez mais reduzidas, as peças usadas ainda trazem uma rentabilidade interessante se forem geridas de forma profissional como estamos a fazer agora. Outra vantagem do novo software foi reduzir substancialmente o papel internamente, nomeadamente ao nível do armazém, onde funcionamos já com PDA´s.
Depois deste investimento no software, o próximo investimento será numa plataforma de vendas B2B?
Sim, o novo software já está preparado para até final deste ano avançarmos com uma loja online B2B. Todos os anos este projeto foi sendo adiado, pensando sempre que é no ano seguinte, mas agora vai mesmo arrancar. Vamos oferecer aos clientes a possibilidade de, através do número de chassis, poder identificar as peças para o camião. Nos grossistas de peças de ligeiros quem não tem plataforma B2B está fora do mercado, mas nos pesados ainda é uma ferramenta que será uma mais-valia para quem a disponibilize aos clientes.
Será o B2B uma ferramenta estratégia para a HBC?
A nossa relação com os fornecedores atualmente é feita através de plataformas B2B. Os fornecedores que não têm B2B estão esquecidos. Por isso, achamos que como fornecedores dos nossos clientes, vai também acontecer o mesmo. Por isso, consideramos que é uma ferramenta importante.
Quais são os argumentos que a HBC considera atualmente como sendo diferenciadores na sua atividade na área das peças?
Diria que temos caminhado em dois sentidos. Por um lado, a aposta na nossa marca própria TTP que oferece uma excelente relação qualidade/preço , e que na maioria das gamas são fabricadas por fornecedores reconhecidos, por outro lado a distribuição das marcas premium, aproveitando desta forma o know-how das peças que eles fornecem para o primeiro equipamento bem como pela disponibilidade de formações que eles nos podem fornecer e que nos permitem estar sempre muito atualizados. Logicamente que temos outros argumentos, como é o caso de estarmos em seis pontos do país com loja física, o que nos permite uma grande proximidade com o nosso cliente.
Depois da sede, em 1998 abriram a loja de Lisboa e depois disso veio Pombal, Ovar, Porto, Rio Maior, Lisboa (novas instalações) e o novo armazém. Estão a pensar abrir em mais localizações?
Estamos sempre disponíveis para novos negócios, mas de momento, sinceramente, não. Temos localizações muito importantes para este negócio e noutras zonas temos uma equipa de vendas externa que nos permite servir o mercado praticamente da mesma forma e com a mesma qualidade de serviço.
Ainda hoje, com a evolução da logística, faz sentido ter tantas estruturas aberturas?
De facto, através dos nossos principais parceiros logísticos, conseguimos hoje ter uma cobertura logística muito boa em pontos onde não temos lojas. Contudo considero que para o nosso modelo de negócio, que temos o número de lojas certo, até porque na sua generalidade estão muito bem implementadas e enraízadas nas zonas onde se encontram o que nos permite um serviço de forma diferenciada.
Qual a importância que o investimento no novo armazém (2015) teve na dinamização da atividade de peças da HBC?
A HBC tem vindo a crescer todos os anos consecutivamente e, logicamente, que o investimento neste novo armazém também contribuiu para tal. Como disse anteriormente temos feito diversos investimentos que fizeram com que o nosso crescimento nas peças fosse muito grande, ao ponto de hoje representarem mais de 90% da nossa atividade.
O que vos trouxe a entrada no Grupo Temot?
O Grupo Temot é dos mais prestigiados grupos a nível mundial, o que por si só constitui uma mais-valia, depois as reuniões e encontros com empresas e pessoas de todo o mundo trazem-nos também bastante conhecimento e desenvolvimento á nossa atividade. Lidamos todos com muitas situações, que por vezes não identificamos como problemas, mas ao partilhar essas experiências conseguimos identificá-los e ter uma solução para eles. A parte mais importante de estarmos no Grupo Temot é precisamente esse networking que existe entre todos. Logicamente que os bónus também são interessantes, existindo um retorno positivo do investimento que fazemos.
O que mudou na vossa estratégia de produtos e de marcas com essa entrada no Grupo Temot?
Não houve muitas alterações, mas passamos a trabalhar com alguns fornecedores preferenciais do Grupo Temot que antes não trabalhávamos. Noutras marcas aproveitamos a oportunidade para complementar algumas gamas de produto, embora sem deixar de trabalhar com fornecedores que são, acima de tudo, nossos parceiros. A verdade é que a maioria das marcas com que já trabalhávamos estão no Grupo Temot.
Em 2005 lançaram a marca própria TTP (Truck & Trailer Parts). O que representa esta marca no vosso negócio?
Já lá vão 15 anos a trabalhar uma marca própria que representa atualmente 20% no nosso negócio de peças novas. Temos vindo a apostar nesta marca própria constantemente mas consideramos que as marcas premium são a nossa bandeira. Uma das particularidades da TTP é que muitas das peças que estão dentro das caixas são de fornecedores de primeiro equipamento.
Quais são as gamas de produto que são cobertos pela marca TTP?
As principais gamas são discos e pastilhas, foles de suspensão, barras e tirantes de direção
e suspensão, jogos de reparação dos caliper´s, escovas limpa vidros, lâmpadas, iluminação, papel de tacógrafo, depósitos de expansão, espelhos, entre outros.
Vão existir novidades em novas linhas de produtos TTP?
Quase todos os anos introduzimos na TTP duas novas gamas de produto. Estamos
em negociações com um fornecedor importante de aftermarket para lançarmos
em breve bombas de água.
Quais são as vantagens, para além do preço, de embalar em marca própria?
Em primeiro lugar estamos a dizer ao cliente que confiamos no produto, caso contrário nunca a embalaríamos numa caixa TTP. Como disse antes, é um produto de qualidade, em que nós conhecemos bem o fornecedor e nos garante total confiança. Em segundo lugar, é que o projeto TTP envolve outras empresas em Espanha, Itália e França, que nos possibilita ter uma estratégia comum para com os fornecedores.
Em 2017 / 2018 a vossa oficina passou a integrar a All Trucks, qual a importância deste projeto para a HBC?
A HBC ainda não está a utilizar todo o potencial que o projeto All Trucks nos pode trazer. Por exemplo, ao nível da oficina, ainda continuamos a trabalhar 100% camiões Scania. O projeto tem potencial, com boas ferramentas e suportado por três boas marcas de peças, que nós disponibilizamos também no mercado, mas é um projeto que que ainda temos que desenvolver dentro da HBC.
Querem abrir mais oficinas HBC / All trucks?
Não temos qualquer projeto para abrir mais oficinas. Aliás, muitos dos nossos clientes são precisamente oficinas e, por isso, temos que ter essa sensibilidade de não fazer concorrência aos nossos próprios clientes.
Não pretendem construir o vosso próprio conceito oficinal?
Não faz qualquer sentido. Tirando as redes oficiais de pós-venda, são muitas poucas as redes de oficinas de pesados independentes. Diversos conceitos que foram lançadas no mercado, por outros operadores, nunca chegaram a vingar.
Para além das peças para camiões, a HBC trabalha também as peças para autocarros, como já falámos, e semirreboques. O que representa o segmento das peças para semirreboques?
As peças para semirreboques representam um pouco mais do que as peças para autocarros. Diria que não chega a 10%. Posso dizer que a parte de travagem e de foles de suspensão são basicamente os produtos que trabalhamos ao nível dos semirreboques. Também na nossa marca TTP temos alguns produtos para os semirreboques, sendo uma área que queremos trabalhar um pouco mais até porque cada camião tem sempre um semirreboque associado.
Que novos investimentos estão previstos no futuro da HBC?
Eu diria que o investimento é feito diariamente. Têm sido constantes os investimentos que temos feito na nossa estrutura e, se de momento nada está previsto, a verdade é que vão surgindo oportunidades e nós lá estaremos sempre para as avaliar. Como já disse antes, até final do ano iramos ter a nossa loja online B2B a funcionar, sendo algo que decorre do investimento feito no nosso software.
Grande parte do negócio é feito através das oficinas dos transportadores, mas as oficinas que existem parecem não estar aptas para a evolução tecnológica que se está a verificar nos camiões. É dessa opinião?
A par da parte tecnológica as oficinas estão com outro problema, que é arranjar bons profissionais! Existem cada vez menos bons profissionais… parece claro que existirão mais dificuldades em acompanhar a evolução tecnológico dos camiões. A formação tem vindo a ser cada vez mais importante e não tem sido tão descurada como acontecia antes. Atualmente já não se pode fazer a manutenção como se fazia antigamente em muitos dos camiões e isso exige necessariamente formação e conhecimento dos profissionais. Considero que a maioria das entidades que fazem manutenção e reparação de camiões ainda não estão disponíveis para comprar formação. Muitas oficinas consideram que a formação é algo que alguém tem a responsabilidade de lhes oferecer. No meu entender as oficinas têm que ter a consciência de que a formação é realmente muito importante.
De que forma a HBC tem apoiado os seus clientes oficinais do ponto de vista da formação técnica?
Nós fazemos formação regularmente, o nosso propósito é poder oferecer formação aos nossos clientes de forma constante, também porque precisamos deles de forma constante e porque o mercado evolui de forma constante! Temos vindo inclusivamente a comprar formação a alguns dos nossos parceiros para depois a oferecermos aos nossos clientes, tem sido um investimento que acaba por espelhar o que referi acima.
Por que razão se continua a investir tanto no negócio de peças para pesados? Como analisa os enormes investimentos que têm sido feitos neste setor?
Na minha opinião o que se está a fazer é comprar mercado, com base em mais investimento o que reduz as margens por via de preços mais baixos. Hoje em dia é muito importante um controlo rigoroso das compras e das vendas bem como das cobranças. A engrenagem funciona de forma tão oleada e as margens estão tão apertadas, que se um destes fatores falha poderemos ter problemas rapidamente. Porém, considero que é uma tendência natural e um sinal de evolução do mercado das peças de pesados. Acredito porém que o surgimento de novos players bem como novos pontos de venda vão acalmar muito, até por via da pandemia.
Artigo publicado na Revista Pós-Venda Pesados n.º 29 de agosto/setembro de 2020. Consulte aqui a edição.