Ver todas

Back

Personalidade do mês – Pedro Moura, Humberpeças: “Em nenhuma das nossas lojas abdicamos do balcão”

O moderno retalho de peças em Portugal é personificado pelo trabalho que a Humberpeças tem vindo a fazer. A proximidade à oficina e fornecer-lhe tudo o que necessita são premissas que fazem mais sentido agora do que nunca.

Aqui na PÓS-VENDA tentamos sempre trazer-lhe aquilo que pensamos ser as boas práticas e os bons exemplos do setor do aftermarket, mas também mostrar o que o moderno retalho de peças está de facto a fazer e que caminho está a trilhar.

Para tal, nada melhor que mostrar o exemplo da Humberpeças, não só porque recentemente investiu no alargamento da sua rede de filiais (abriu na Póvoa de Varzim a sua 8º filial), mas também porque diversificou o seu negócio de peças para as ferramentas, equipamentos, consumíveis, pneus e, tudo indica, o fará também para o setor da… repintura automóvel. Na Humberpeças há oito anos, sendo um dos braços direitos da administração, Pedro Moura, abre uma parte do jogo e divulga o que a sua empresa está a fazer para se diferenciar no mercado e, sobretudo, ser uma mais-valia para as oficinas clientes.

Como é que atualmente se pode definir a Humberpeças? Assumem-se como retalhistas de peças?
A Humberpeças é um retalhista de peças puro e duro!!! Continuamos a assumir absolutamente essa posição. Logicamente que a nossa estratégia foi saltar o distribuidor / grossista, que estava a ter muita influência no nosso mercado e que sentimos uma grande pressão deles, mas mesmo passando a ter acesso aos fabricantes, a nossa postura no mercado continua a ser o cliente profissional, isto é, a oficina.

Não existe qualquer tendência de se tornarem também um grossista…
Não, nunca foi nem será essa a nossa estratégia.

Pela enorme capacidade de stock da Humberpeças ainda se pode afirmar que estamos em presença de um retalhista de peças tradicional?
Como disse, o nosso foco é o cliente profissional. Temos quase 7.000 m2 de área de armazenagem, distribuído pela nossas lojas, o que para um moderno retalhista é perfeitamente normal, quando o objetivo é ter a peça para de imediato satisfazer a necessidade de qualquer oficina.

Entende que a posição que certos grossistas estão a assumir em determinadas regiões e em Lisboa e Porto em particular, leva retalhistas como a Humberpeças a expandir o negócio para outras regiões, como tem feito nos últimos anos?
O crescimento, na gestão atual da Humberpeças, sempre foi uma ambição da empresa. Não um crescimento desmesurado, mas sim controlado, em que não partimos para nenhum novo projeto sem que o anterior esteja perfeitamente consolidado. Sempre foi política da Humberpeças ter material dentro de casa para poder servir o cliente. O aumento do stock deve-se a algumas situações de mercado que temos vindo a notar, nomeadamente com a descida de alguns distribuidores à terra, o que deixa qualquer casa de peças a pensar no seu negócio. Começou de facto nos grandes centros, mas essa é uma tendência que já se começou a espalhar para outras regiões mais interiores. Se tivermos um “punhado” de distribuidores que não fazem oficinas, poderei dizer que talvez sejam muitos, uns de forma assumida outros nem tanto.

Na sua opinião o mercado português vai seguir o exemplo de Espanha, em que a cadeia de distribuição entre a marca e a oficinas está cada vez mais curta?
Penso que neste momento não existem mais elos da cadeia de distribuição de peças para saltar. Os custos logísticos não permitem que a marca / fabricante se aproxime das oficinas. Tendo em conta que os stock dos fabricantes estão cada vez mais otimizados, acredito que os urgentes possam seguir diretamente para a oficina, que aliás já está a acontecer.

Como é que um retalhista, como a Humberpeças, se tem vindo a preparar para este encurtar de relação entre a marca e a oficina? A Integração no Grupo ASER, em 2018, foi um passo nesse sentido?
Para nós a ideia de integrar o Grupo ASER foi muito claro: chegar ao fabricante. Trata-se de um caminho que não é fácil percorrer em Portugal, mas que em Espanha existe maior facilidade a esse nível. O Grupo ASER facilitou-nos muito esse acesso, podendo agora uma empresa como a nossa chegar às pessoas que têm poder de decisão.

Os pressupostos da vossa entrada para o Grupo ASER ainda hoje se mantêm ou foram melhorados?
À data de hoje ainda se mantêm e foram, obviamente, melhorados. Quando entramos para o Grupo ASER, apesar de já termos alguma dimensão, foi um caminho muito duro, até porque continuamos a ter uma dimensão regional. No início foi difícil explicar isto para os fabricantes nos aceitarem, mas hoje é precisamente o contrário, até porque o projeto evolui muito e o próprio Grupo tem muitos mais parceiros em Portugal do que tinha antes, o que garante um outro poder de negociação. Um dos pressupostos da nossa entrada para o Grupo ASER era precisamente esse, levando a uma mudança de paradigma dos fabricantes em relação a uma empresa como a Humberpeças, o que é um excelente sinal por parte deles em relação aquilo que estamos a fazer.

O que tem vindo a representar e o que representa no negócio a vossa presença no Grupo ASER?
Uma grande parte das nossas compras passa pelo Grupo ASER, mas não temos o mínimo problema de continuar a trabalhar com os distribuidores em Portugal. O nosso foco, como disse, é ter a peça para servir o nosso cliente. Contudo, apesar de termos muitos fornecedores que estão homologados na central do Grupo ASER, nós não trabalhamos com eles todos. O que nos interessa, juntamente com os outros parceiros em Portugal do Grupo ASER, é podermos trabalhar um número máximo de marcas comum a todos os parceiros.

De que forma a vossa política de marcas e produto se alterou desde que se associaram ao Grupo ASER? Que tipo de produtos passaram a comercializar que antes não disponibilizavam às oficinas?
Obviamente que existiram algumas alterações, nomeadamente em algumas marcas que passamos a trabalhar diretamente. Também acrescentamos algumas novas marcas que antes não tínhamos, nomeadamente em segmentos que não trabalhávamos, e outras que pelo facto de passarmos a ter mais acesso à informação nos levou a trabalhar mais com essas marcas. O facto de trabalharmos diretamente com os fabricantes permitenos ter acesso a muitas mais informações que antes nos estava vedada.

E isso é muito importante…
Muito importante mesmo. Para uma empresa que tem o departamento de compras organizado como nós, permite-nos fazer uma avaliação constante dos novos produtos e das necessidades de stockagem. Como gostamos de trabalhar as gamas de A a Z, este tipo de acesso à informação faz muita diferença e facilita-nos muito o trabalho na pesquisa de novas referências.

Como analisam o crescimento dos Grupos de Retalho nas peças? É um modelo de negócio que vai singrar?
É uma boa experiência, que nós recomendamos, mas apenas para um tipo de retalho de peças que se queira de facto organizar e profissionalizar. Na minha opinião, um gerente de uma casa de peças que esteja todo o seu tempo ao balcão não irá ter tempo para pensar nisso. Por outro lado, exige também que a estrutura física da casa de peças esteja preparada, com capacidade de armazenamento.

Estando no Grupo ASER vão também começar a dinamizar o conceito oficinal ASER AUTO?
Já existiam conceitos de rede em Espanha que poderíamos ter importado para Portugal. Mas não quisemos fazer isso. A nossa escolha e dos parceiros portugueses do Grupo ASER foi desenvolver um conceito de raiz adaptado à nossa realidade e que tivesse dimensão nacional. Por isso, e já com 9 parceiros no Grupo ASER, só agora começou a fazer sentido dinamizar esse projeto em Portugal. O projeto já foi lançado, já existem oficinas que o vão a integrar e em breve começaram a ser conhecidas.

Porque razão é importante lançar uma rede oficinal? A fidelização é importante?
Mais do que a fidelização, é acima de tudo uma necessidade que as oficinas procuram. Portanto, é uma situação que vem do mercado para nós e não o contrário. Se o mercado assim o dita, porque se querem profissionalizar, mas não sabem como, então temos que lhes proporcionar essa possibilidade, aliás, tal como nós o fizemos na nossa atividade. O conceito ASER AUTO foi muito bem estudado em função das necessidades dos nossos clientes oficinais, sendo focada na disponibilização de uma solução completa às oficinas com a ideia de que também eles possam fazer crescer o seu negócio.

Que desenvolvimento, como Humberpeças, querem para esta rede oficinal?
O nosso foco não será a massificação do conceito, mas sempre para um nível de oficinas que não queiram apenas ter acesso a dados técnicos ou linhas de apoio, mas pretendam trabalhar outras áreas, por exemplo, com os clientes de modo a fazer crescer o seu negócio. Nem todas as oficinas estão preparadas para isso.

O que é que a Humberpeças tem feito ao nível da formação para as oficinas? A formação para as oficinas é um projeto estruturante para a Humberpeças?
A formação é fundamental para as oficinas. É algo que está no projeto da rede oficinal ASER AUTO, mas que nós já fazíamos e estamos a fazer. Na nossa visão existem três tipos de formação que são necessárias para as oficinas: a formação certificada prática, formação técnico comercial e formações (ou workshop´s) sobre a componente de gestão do negócio. Estas três áreas são essenciais para a oficinas, primeiro porque têm que continuar a fazer bem o serviço técnico, em segundo porque o cliente está cada vez mais exigente e informado e isso leva a que tenham que estar mais preparados técnica e comercialmente e, por último, têm que evoluir ao nível da componente da gestão do seu negócio.

De todos os argumentos que os retalhistas usam para cativar o cliente oficinal, qual é aquele que tem mais impacto? É o preço? Campanhas? Serviço?
Acho que nem sempre é o preço. Penso que o serviço é o argumento mais importante de todos, pois de nada vale ter preço se não tivermos a peça para entregar. Por outro lado, os preços estão cada vez mais equilibrados e isso já não faz a diferença. Aliás, a tendência é mesmo os preços serem cada vez mais “iguais” nos retalhistas, tal como acontece, por exemplo, com o pão nas padarias.

Alguns dos mais modernos retalhistas nacionais têm vindo a abdicar do balcão em detrimento da distribuição. Acha que isso é uma tendência, ou será impossível isso acontecer na vossa operação?
Em nenhuma das nossas lojas abdicamos do balcão, nem pomos isso como hipótese atualmente. O que fizemos foi melhorar muito o nosso serviço de call-center, tendo em conta que o nosso principal canal de vendas continua a ser o telefone. Neste momento temos 14 pessoas só no call center, para apoio a todas as lojas.

Existe alguma tendência sobre a importância que o balcão tem para o vosso negócio?
No nosso caso tem uma importância fundamental e até sou defensor que o balcão devia aumentar. Como nos estamos a focar cada vez mais no “one stop shop”, trabalhando para além das peças, as ferramentas, os equipamentos e outros segmentos de negócio, entendemos que o cliente gosta de ver e de olhar para estes produtos. O que estamos a fazer é passar estes produtos para a frente do balcão, para que o cliente possa ter contato com eles, nomeadamente tudo aquilo que não seja peças.

O aumento dos custos do combustível não poderá arrefecer a atividade logística na entrega de peças às oficinas?
A questão dos transportes e da entrega da peça não vai sofrer grandes alterações. Talvez a “falsa” urgência passe a ser melhor mediada e as rotas vão ter que ser mais otimizadas, mas isso é algo que uma empresa como a nossa tem que saber gerir, nomeadamente quando se gera 22 carrinhas de distribuição e 14 motos. Admito, contudo, que o balcão possa vir a ganhar uma importância maior por via desta questão.

A Humberpeças já tem website B2B. Continua a ser difícil implementar esta ferramenta junto dos vossos clientes oficinais?
Já trabalhamos com essa ferramenta desde 2014 e continuamos a investir na mesma. Os dados mostram que o número de oficinas, de pedidos e o número de peças por pedido tem aumentado, mas estamos conscientes que em muitos dos nossos clientes não é praticável. Na teoria esta plataforma devia substituir o balcão e o call-center, mas na nossa ideia é irreal algumas oficinas, a grande maioria que só tem duas ou três pessoas, trabalharem com este tipo de plataformas, pois o mecânico que está a trabalhar no carro tem relutância em mexer num computador ou no ecran de um tablet para pedir as peças. A grande maioria usa o telefone, que continua a ser de longe o meio mais usado para pedir peças. Agora, oficinas mais dinâmicas, mais estruturadas e com receção ativa, têm uma tendência crescente de usar estas plataformas. Nas peças identificáveis por TecDoc, já passa os 10% de pedidos, o que não deixa de ser um número interessante. A evolução e os investimentos que estamos a fazer nesta plataforma, trazendo mais informação e mais funcionalidades para a oficina irá potenciar ainda mas a utilização desta ferramenta junto dos nossos clientes.

Tendo o retalho uma ligação de proximidade tão grande com as oficinas, que análise faz do desenvolvimento técnico das oficinas independentes com as quais trabalha?
As gerações vão mudando e notamos que existe claramente uma maior evolução técnica das oficinas com que trabalhamos. Notamos também que existe maior interesse pelas formações e isso é muito positivo. Porém, as oficinas terão que fazer obrigatoriamente este caminho, pois a evolução tecnológica do automóvel assim o obriga.

A Humberpeças tem diversas localizações. Até onde a Humberpeças pode crescer geograficamente?
A grande novidade para já foi a abertura de uma nova loja, a oitava, desta feita na Póvoa de Varzim. Desta forma continuamos a dar expressão ao nosso crescimento de proximidade às oficinas, do ponto de vista geográfico, dentro da nossa área de influência. Continuamos a ser um retalhistas de peças regional e é assim que nos queremos manter.
Já fornecem peças de mecânica, peças de chapa, pneus, equipamentos e ferramentas às oficinas.

Que outras áreas de produto ainda podem fornecer aos vossos clientes?
Tendo em conta que temos clientes na área da mecânica, da eletricidade e da chapa / pintura, entendemos que poderemos vir a trabalhar o segmento da roupa de trabalho, pois existe uma pressão cada vez maior nesta área por questões de segurança, e as tintas.

Sendo um negócio com uma especialização própria, admitem entrar no negócio de tintas?
Acredito que com os parceiros certos essa solução possa vir a ser incorporada no nosso portfólio. Neste caso traço um paralelo com o negócio dos pneus, que atualmente temos no nosso leque de produtos, sem que sejamos uma empresa expert em pneus. Trata-se de produtos complementares, que com os parceiros certos podem ser dinamizados. A nós interessa-nos a ideia de que o cliente possa vir à Humberpeças e encontre tudo o que necessita para o seu negócio. Para as oficinas de chapa e pintura, já temos os consumíveis, as ferramentas, já vendemos peças de chapa e por isso só falta mesmo as tintas.

No seu entender quais são os principais desafios que um retalhista como vocês enfrentam para um futuro a médio prazo?
O primeiro desafio que enfrentamos tem a ver com recursos humanos. Por mais digitalizada e verticalizada que esteja a informação, a mesma ainda requer muito conhecimento específico, nomeadamente a reparação mecânica e elétrica. Não existe num curso de formação para se trabalhar em casas de peças e quase 100% dos retalhistas formam os seus próprios recursos. A médio prazo, para não dizer a curto prazo, a escassez de produto. Existe uma cada vez maior dificuldade em obter produto e existem muitas referências que estão em falta. Existem problemas de reposição e isso será um grande desafio.

Artigo publicado na Revista Pós-Venda n.º 80 de maio de 2022. Consulte aqui a edição.

PALAVRAS-CHAVE