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Personalidade do mês – Pedro Rodrigues da Alecarpeças: “O nosso serviço já não é só vender peças”

Com duas novas importações a chegar e o plano de abrir mais uma loja Alecarpeças em Lisboa, Pedro Rodrigues diz que os operadores deste mercado sempre souberam adaptar-se às evoluções que surgiram. Na gestão é que tem sido mais difícil.

Pedro Rodrigues diz que nas entrevistas é muito mais importante aparecerem as empresas do que as pessoas, mas a sua presença é indissociável do caminho que a Alecarpeças tem feito de há 17 anos para cá. Além disso, o seu conhecimento de mercado ou a clareza e coragem nas opiniões faz com que a sua voz seja sempre ouvida por quem está atento ao aftermarket nacional. Existe ainda a vantagem de a Alecarpeças ser um retalhista com venda direta às oficinas (balcão e tudo) e simultaneamente grossista de peças. No contacto mais próximo com os reparadores, tem sabido acompanhar as evoluções de mercado, o que lhe dá estrutura para avançar, este ano, e finalmente, para uma loja na região de Lisboa. Junto das marcas de peças, como importador/distribuidor, esteve com a Febi Bilstein até esta entrar diretamente em Portugal e continua a importar outras marcas, mas sempre com uma aposta clara na qualidade. Os desafios que este mercado hoje enfrenta são imensos. “Hoje em dia, a oficina exige de nós um serviço que não passa apenas pela identificação e compra da peça”, diz. “O serviço já é também identificação, entrega, logística inversa, garantias e informação técnica”.

Que diferenças encontra entre o momento em que entrou para a Alecarpeças e agora?

A nível da empresa houve uma mudança enorme, tanto na estrutura como na própria oferta de produtos. Éramos uma empresa muito conectada com fabricantes e marcas alemãs e continuamos a ser, mas agora com uma grande diferença. Esta conceção que as pessoas tinham de nós fazia crer que só vendíamos para carros alemães, mas não era assim. Eram fabricantes que fabricam para todas as marcas. E, durante determinado período, a Alecarpeças viveu de fabricantes alemães a vender para carros alemães. Hoje em dia, somos muito mais abrangentes. Mas não deixamos que grande parte dos fornecedores sejam de origem alemã.

Sobre a relação da Alecarpeças com as oficinas: o que era válido há 17 anos ainda é válido hoje?

Temos vindo a acompanhar esta evolução do mercado. As oficinas têm também evoluído, com um nível de exigência maior, até porque o setor lhe tem dado essas condições. Temos tido sempre o cuidado de apoiar as oficinas com todas as ferramentas tecnológicas que podemos dar. Somos das poucas empresas que disponibilizamos para as oficinas uma ferramenta de diagnóstico, o TECRMI. Ou seja, enquanto o padrão é oferecer a plataforma online para as oficinas identificarem e comprarem, tentámos ir além disso oferecendo informação e dados técnicos. Hoje em dia, a oficina exige de nós um serviço que não passa apenas pela identificação e compra da peça. O serviço já é também identificação, entrega, logística inversa, garantias e informação técnica. Isto tem que ser visto como um pacote, não pode ser só a peça.

A tipologia das oficinas continua a ser a mesma ou alterou-se?

Acho que tem evoluído. Esta nova distribuição, com as redes organizadas, veio mostrar às oficinas independentes que esta organização se calhar também lhes traz vantagens. E eles, de uma forma muito pessoal, vão entendendo e apanhando alguns exemplos e boas-práticas destes grupos oficinais. É evidente que estas oficinas têm evoluído. Vemos hoje oficinas independentes com padrões e imagem que podiam estar encaixadas em qualquer grupo. São eles que têm percebido que o caminho é este.

E a nível de gestão, a oficina tem evoluído?

Isso é mais difícil. Mas também é compreensível. As oficinas têm que se preocupar com uma série de fatores. É preciso, por exemplo, chamar os clientes para a oficina em vez de ficar à espera que o cliente entre na oficina. Como o carro está cada vez mais tecnológico, têm que ter cada vez mais disponibilidade para ir a cursos. No meio disto tudo, falta tempo para alguma coisa. E, infelizmente, falta tempo para a gestão.

Da mesma forma que as oficinas se juntam a redes, também começam a aparecer oficinas cada vez maiores…

Sim, sem dúvida. Não só por uma questão de espaço físico, que obriga a ter os carros parados mais tempo. Por isso, o crescimento foi na proporção, porque perceberam que podem ter mais serviço. Ou seja, quem abre hoje uma oficina não está a pensar apenas em uma ou duas baias de trabalho. Pensa em espaços maiores.

Mas continua a haver a oficina pequena…

Sim, mas tende naturalmente a desaparecer. Não é preciso um polícia para essas oficinas, o próprio consumidor vai selecionar. Mas é uma realidade.

Afeta muito o negócio das peças?

Prejudica a economia. Não beneficia nem prejudica o negócio das peças. Quem quer montar uns amortecedores vai ter que os comprar. O negócio paralelo de vender peças esfumou. E é muito difícil vender sem fatura. O mecânico te para o carro dele. No entanto, não lhe posso exigir que leve a peça com fatura e número de contribuinte, porque a própria lei não o exige.

Essa Lei devia ser alterada?

Mas não é só no nosso setor (risos). Por alguma razão, o fisco apontou três setores de forte economia paralela e um deles era a reparação automóvel.

Do lado das casas de peças qual terá sido a maior evolução nos últimos tempos?

Acima de tudo, acho que são as ferramentas tecnológicas que se desenvolveram. Isso levou a que uma peça se identifique mais rápido, se coloque mais rápido… Provavelmente, por isto, o nosso negócio no aftermarket tem evoluído, como se pode ver nas empresas de topo. Outra evolução foi o profissionalizar de algumas operações que não eram vistas como importantes.

Os desafios para o retalho de peças serão também maiores?

Sim, até porque são também colocados pelo aplicador. Ele é que faz essa pressão. Ele desmonta a peça e quer montá-la daí a uma hora.

Não há aí um excesso?

Há, a logística da peça de um carro é mais apurada que a dos medicamentos. Vender uma embraiagem é mais urgente do que um pacemaker!

E uma casa de peças tem que acompanhar essa evolução ou há como dizer que não?

Nem pensar, nem pensar.

Mas não se está a voltar para trás?

Isto depois cria desorganização no sistema, inclusive do nosso lado. A logística inversa é um problema. Mas a logística por si só é outro problema. Porque de facto, estar tão apurada faz com que o mecânico tenha essa urgência e vá pedindo cada vez mais aos seus fornecedores. E isto tem custos.

No entanto, a logística já foi passada para outros operadores…

Agora cabe aos importadores o papel que a casa de peças tinha. Esta agora não tem necessidade de ter um stock tão abrangente e pesado, porque o serviço de logística cobre-lhe uma série de necessidades.

Isso significa que o papel do importador junto da oficina será cada vez maior?

Essa é uma tendência que se tem verificado.

Houve uma altura em que se dizia que os retalhistas iam desaparecer…

Isso não acredito. Não acredito mesmo. Mas, cada vez mais, o importador irá à oficina. Ou a oficina ao importador. Há importadores com logística e estrutura para irem à oficina. Há outros em que é a própria oficina que tira partido da sua localização geográfica. Até o consumidor final pode comprar diretamente ao fabricante. São realidades diferentes às quais teremos que nos adaptar. O retalhista poderá perder alguma importância nos grandes centros urbanos, onde os importadores já têm as suas infraestruturas muito vincadas. Mas tem que se apurar e criar ferramentas para deixar de ser o retalho tradicional a que estamos habituados. E eles também estão a perceber isso.

Não é preocupante que oficinas consigam comprar mais barato em portais dirigidos ao consumidor do que nos seus retalhistas?

Acima de tudo é preocupante porque significa que ela vai lá pelo fator preço. Não é por mais nada. E isto coloca pressão. Mas quem tem que resolver este problema são os fabricantes. Pergunto se não haverá demasiados fabricantes para colocar todas as peças no mercado que depois causam toda esta pressão? Fabricantes no sentido de marcas, porque há famílias de peças com alguns fabricantes, mas depois com dezenas de marcas.

Vês o fabricante com vontade de resolver isso?

O fabricante depende de toda a estrutura que está abaixo de si. Mas ele vai-se moldando em função do que são as necessidades de mercado. Se o fabricante vê que o canal online é um canal interessante para ele, acaba por entrar.

Não interessará às marcas de peças estar mais próximo dos construtores de automóveis do que do aftermarket?

Isso é capaz de ter o seu quê de razão num futuro próximo. No imediato, ainda não. O que se tem assistido é a vontade das marcas de automóveis em entrarem no setor do aftermarket. A nível dos fabricantes não sei se pode vir a ser um problema para nós. O que é importante é estar com as marcas de primeiro equipamento. Isto é aquilo que ainda podemos aproveitar.

O eCall é um desafio para o aftermarket?

Acho que não. Está a querer criar-se um “papão” e uma nuvem negra onde ela não existe. É uma realidade, mas vão encontrar-se soluções.

Pedro Rodrigues_ ALECARPEÇASA agressividade das marcas próprias dos construtores automóveis e marcas de peças é uma ameaça?

A questão de como vai ser vendido o carro é mais importante do que como vai ser reparado. Porque vai sempre haver mercado para a oficina independente e para os outros. A pressão vai ser na forma como os carros vão ser vendidos: com os planos de manutenção ou o renting. Mas as empresas vão encontrar soluções. As seguradoras, por exemplo, encontraram soluções com os distribuidores do mercado independente. Penso que no nosso mercado também vai acontecer o mesmo. Cada vez mais, as marcas vão querer meter um pé no nosso setor.

E outro tipo de integrações entre os dois canais?

Se calhar, o que achávamos que ia ser um extremismo de caminhos vai ser uma aproximação. Se nos últimos anos percebíamos sempre o que lá vinha, hoje em dia a evolução é de tal ordem que é difícil perceber o que vai ser daqui a cinco anos. Temos que saber criar estratégias para o futuro, mas é tramado quando ainda não sabemos o que vai ser esse futuro. Se calhar daqui a 20 anos tudo se vai resumir a uma sala como esta….

Este negócio vai resumir-se à informação?

Vai ser um negócio muito mais tecnológico. Vai mudar, mas que isto seja dramático? Não, o negócio vai adaptar-se. Mas temos sabido evoluir rapidamente. E a prova é que, hoje em dia, a forma de identificarmos peças é muito mais apurada do que era há dez anos atrás. Adaptámo-nos.

Nos grossistas, como vê esta tendência internacional de os grandes grupos de compra se associarem cada vez mais? Parece que o objetivo é reduzir o custo da peça.

Sim, mas para quem? Para quem compra nesses grupos de compras, não para o consumidor final. No nosso setor têm aparecido muitas modas. Acho que os grandes grupos é mais uma moda. Mas tem vingado! É muito interessante para quem vende, porque acaba por ver ali um grupo muito maior de clientes. Se traz o proveito devido no final de contas? Ponho as minhas dúvidas.

A Alecarpeças faz parte de alguma rede ou grupo?

Não. O mercado nacional é muito fragmentado. Não há ninguém com peso suficiente no nosso aftermarket para fazer alguma coisa.

RETALHISTA OU GROSSISTA

Vê mais a Alecarpeças como um retalhista ou um grossista?

Hoje em dia, 65% das nossas vendas são a retalho, 35% a oficinas. Somos grossistas. Mas vejo o mercado oficinal como um mercado interessante para venda direta, como retalhista. O importante é nós próprios sabermos diferenciar os nossos sectores, com condições diferenciadas para cada um.

As condições de venda estão perfeitamente estruturadas?

Temos uma estrutura de preços que diferencia o retalho, a oficina e o consumidor final. Mas a tendência é que esta diferenciação se venha a esbater. É o que já aconteceu noutros negócios e vai acontecer no nosso.

Outra forma é diferenciar pelos serviços. Isso também acontece na Alecarpeças?

Já o fazemos de certa forma. Adaptamo-nos a cada sector. Os dados técnicos que damos à oficina têm um custo para nós. Isto tem que ser imputado, caso contrário a diferenciação continuaria a acontecer. Mas também acho que esta diferenciação de preço se vai esbater, por força da concorrência ou da agressividade do mercado.

REDES DE OFICINAS: NECESSÁRIAS?

Para se ser oficina independente tem que se estar em rede?

Não creio, mas é mais difícil se não o fizer. Isso exige de nós uma procura e uma busca maior para dar essas ferramentas a quem é independente. Nem todas as boas oficinas têm que pertencer a redes oficinais.
Há oficinas independentes que estão bem estruturadas e preparadas. E com padrões de grupos oficinais, sem tirar nem pôr.

É positivo que algumas oficinas não estejam em redes?

Sim. E para o consumidor final também. Acho que têm que existir diferentes realidades. De um lado e outro há vantagens. O padrão de qualidade tem que subir. A oficina tradicional, suja e desorganizada, tende a desaparecer. Até porque, por exemplo, cada vez mais o cliente feminino tem aumentado nas oficinas. E por isso tem havido um maior cuidado a nível de imagem. A nível de organização, a própria necessidade tem feito com que eles evoluam. Não se pode pegar num carro hoje com as mesmas ferramentas de há 20 anos.

APOSTA 
NA QUALIDADE

A qualidade alemã sempre foi um ativo da vossa parte. Isso ainda se mantém hoje?

Sim, aliás é um pilar que nós até fazemos questão de manter. E vivemos num mercado muito pressionado por preço, preço e preço. Não é de hoje e já foi mais do que agora, mas continua a ser um mercado muito pressionado pelo fator preço. E nós temos resistido a isso. Não quer dizer que não tenhamos aqui um binómio de qualidade-preço, mas temos resistido e temos mantido no nosso portfolio marcas de qualidade, premium, de equipamento original. Praticamente todas as marcas com que trabalhamos são de primeiro equipamento.

NOVIDADES

Que novidades estão para lançar?

Vamos apresentar a curto prazo mais duas marcas, mas generalistas, com uma série de produtos desde filtros, travagem, embraiagem. Estas duas marcas aparecem como oferta de linha mais económica, mas que nos oferecem confiança nos padrões de qualidade.

Estão previstas outras novidades?

Em princípio vamos lançar um novo site de identificação e peças, com verificação de matrícula e dados técnicos. E estamos neste momento a desenvolver um software para dar às oficinas uma ferramenta de orçamentação baseada em peças de aftermarket e uma ferramenta para gerir todo o processo de logística inversa. Em principio será este ano que vamos abrir um terceiro ponto de venda na região da grande lisboa. A oficina quer proximidade, a logística não chega a tudo.

Pedro Rodrigues_ ALECARPEÇASPERGUNTAS RÁPIDAS

Qual foi o seu primeiro carro?

Um Seat Ibiza, para aí de 1987, a gasolina.

Quantos quilómetros faz por ano?

Já fiz muito mais, mas agora são apenas cerca de 25 mil quilómetros.

O que mais gosta no setor?

A relação humana que se estabelece.

E o que menos gosta?

A falta de lealdade e de transparência.

É importante ir ao terreno e visitar as oficinas e os retalhistas?

Acho que é importantíssimo visitar as oficinas. No início até fazia questão para perceber.

O que gosta de fazer nos tempos livres?

Já consigo preservar muito mais tempo do que anteriormente. Estar com a família, jogar golf, padel ou andar de moto com os amigos.

PALAVRAS-CHAVE