A celebrar 15 anos de distribuição de peças para automóveis, a CARF está constantemente atenta às mudanças e necessidades do mercado. Paulo Carvalho faz uma retrospetiva do percurso da empresa, e da estratégia atual e futura da CARF.
ENTREVISTA PAULO HOMEM E NÁDIA CONCEÇÃO FOTOS MICAELA NETO
Especialista a 100% na área automóvel, a CARF iniciou a sua atividade na região de Lisboa e assume atualmente uma posição de relevo neste setor, em todo o país, na distribuição de todo o tipo de componentes. Paulo Carvalho fundou a empresa em 2003 com quatro sócios, e, atualmente, continua a ditar os destinos da CARF, juntamente com o filho, Mário Carvalho, gestor comercial da empresa.
Quando fundou a empresa tinha a noção do que a CARF poderia vir a representar no setor das peças em Portugal?
Inicialmente não tinha a noção do que a empresa poderia vir a representar, só comecei a ter essa noção um pouco mais tarde. Estava numa empresa ligada ao setor das peças, e surgiu a ideia. O nosso primeiro cliente foi a Imporpeças e, entretanto, a mensagem foi passando. A ideia foi sempre fazer mais e melhor, com maior abrangência e menor custo para o cliente.
Nessa altura não se falava ainda em entregas bidiárias?
Ainda não. A maioria das empresas em Lisboa, onde iniciámos, tinha carrinhas próprias para fazer as suas entregas, tentavam entregar rápido e localmente, com meios próprios. Nós quisemos entregar rápido, mas de forma mais abrangente, com uma empresa que servisse a todos, que tivesse uma abrangência maior e um custo completamente diferente. Desde o início que apostámos sempre na diferenciação, ou seja, pensar o que é que poderíamos acrescentar ao mercado. Percebemos que tínhamos de agitar o mercado e que havia espaço para a CARF. E o mercado aceitou isto com alguma celeridade. Começámos em 2003, e, se considerarmos que a primeira filial nasce 10 anos depois da fundação da empresa, percebe-se que nunca demos passos mal calculados. A partir de 2006 o negócio tornou-se mais consistente e mais acelerado. Entretanto começámos a abranger a zona de Leiria, e atualmente, entregamos peças duas vezes por dia, de Lisboa a Bragança.
Em 2013 a CARF foi adquirida pela Totalmédia. O que representou esta etapa?
Foi um momento de viragem. Havia a vontade de sermos uma empresa com dimensão nacional. A CARF era uma empresa familiar, mas queríamos maior rapidez. E a entrada na Totalmédia veio trazer mais capacidade, começámos a gerir o negócio de outra forma. Numa fase inicial aproveitámos as sinergias, as estruturas do grupo, o que nos deu uma nova alavancagem para aquilo que queríamos. Não podemos olhar para este negócio só ao nível de Portugal, e a Totalmédia está em Espanha. E percebemos que era para ali que tínhamos de olhar.
Não foi um crescimento demasiado rápido?
Em 2016 tivemos um ano negro, mas que não associamos à entrada no grupo Totalmédia. Existiu uma grande vontade nossa em crescer mas a estratégia não foi bem definida, porque nem tudo se resume a capital, é muito importante também a formação das equipas, e foi essa a nossa maior dificuldade. Estivemos 10 anos para abrir a primeira filial, a de Leiria, e no espaço de um ano e meio abrimos três: Algarve e Porto em 2014, e Vila Real em 2015.
O cliente percebeu que a CARF entregava sempre no próprio dia, de manhã e à tarde…
A segunda entrega, a da parte da tarde, normalmente é algo urgente, que ficou esquecido de manhã. Foi nossa intenção criar necessidades e potenciar isto. A CARF teve um papel importante na dinâmica do negócio do aftermarket em Portugal, porque anteriormente fazia-se uma entrega por semana para fora de Lisboa e Porto. E, hoje em dia, um cliente que faça um pedido a partir de Castelo Branco, por exemplo, se receber às cinco da tarde uma encomenda que fez de manhã, já não fica satisfeito.
Ajudaram os operadores de peças a reduzir custos?
Sim, não temos dúvidas do ganho que existiu para estes operadores. Há empresas no mercado que podem fazer, por exemplo, uma recolha em Lisboa para entregar em Bragança no próprio dia, mas penso que não existe nenhuma que o faça pelo valor que nós apresentamos ao cliente. A CARF tem uma tarifa base, como se fosse uma entrega para o dia seguinte, mas que consegue fazer no próprio dia, para qualquer ponto do país. Desde Lisboa, saímos à tarde até Tavira, Évora, Castelo Branco, Guarda, Fundão, Bragança, Viana do Castelo, Viseu e Porto. E a partir do Porto fazemos o mesmo até Coimbra. E isto é a nossa diferenciação. Há um esforço muito grande da CARF para manter este nível de serviço ao preço que pratica. Achamos que o cliente deve olhar para esta diferenciação e perceber que a CARF continua focada apenas neste mercado e que deve ser olhada como o grande parceiro das empresas deste setor.
A CARF aumentou recentemente a tarifa. Que reflexos teve na vossa atividade?
Sim, o ano passado aumentámos a tarifa em 15%. Foi uma decisão que foi tomada porque estávamos a entrar numa situação em que, para mantermos o mesmo nível de qualidade de serviço, teríamos forçosamente de aumentar a tarifa. Para os clientes não foi fácil, mas não tivemos nenhum que tivesse deixado de trabalhar connosco. Os clientes perceberam a intenção e a necessidade desse aumento e estiveram sempre com a CARF. Foi um impacto muito grande, mas ainda assim somos uma empresa muito acessível. Se o cliente calcular o impacto da nossa tarifa no seu negócio e aquilo que fazemos em prol da sua estrutura e também o que conseguimos potenciar a algumas empresas, que deram um salto em termos de vendas para outras zonas do país às quais que não conseguiriam chegar de outra forma, penso que olha para nós como um parceiro estratégico.
Continua a ser dispendioso fazer chegar as peças ao interior do país?
Portugal tem grandes assimetrias entre o litoral e o interior e por isso, temos dois problemas ao fazer chegar as peças ao interior: temos o problema de levar a carga dos grandes centros para lá, e nestas zonas são feitos trajetos de muitos quilómetros, muitas vezes em estradas sem as mesmas condições das estradas da zona litoral, e representam um custo consideravelmente superior, porque não transportamos tanta carga, e a tarifa é única. Não fazemos distinção de tarifas. Continuamos com a mesma forma de trabalhar: colocar no mercado uma forma simples e prática de trabalhar connosco. Temos várias formas de trabalhar, sempre no sentido de simplificar o processo. Pela via do custo, que é igual para qualquer zona, e pelo peso: há um preço acordado com o cliente, por forma a não lhe trazer dificuldades operacionais. A densidade populacional do litoral não tem nada a ver com a do interior. Mas existem bons distribuidores no interior, não em quantidade, mas em qualidade.
Os operadores que fazem serviço local poderão ser complementares ao serviço da CARF?
Sim, já fazemos esse trabalho, através de parcerias. Temos gestão direta em três plataformas: Lisboa, Leiria e Maia, e todas as outras plataformas são parcerias. Foi uma estratégia definida no ano passado que está a resultar muito bem: as estruturas de Vila Real e de Albufeira são subcontratadas, e temos um parceiro para Évora, Viseu e Guarda. Esta é a melhor forma de lidarmos com a assimetria entre o interior e do litoral. Atualmente estamos a trabalhar em mais duas parcerias, em zonas estratégicas. E ainda estamos a tentar trabalhar noutra parceria, para tipologias pesadas.
A distribuição de pneus foi iniciada em 2011. O que representou para a empresa?
Os pneus foram mais uma aposta que fizemos, mais um produto a entrar na estrutura, mas inicialmente causou-nos alguns problemas, porque é um produto volumoso. A sua chegada obrigou-nos a ter mais meios, para além de adaptarmos os que já tínhamos. Tivemos de alterar a nossa estrutura de viaturas e deixámos de poder ter as mais pequenas. Já tínhamos a dificuldade com os componentes de colisão, e os pneus foram outra dificuldade neste aspeto. Mas dá-nos satisfação ver que ajudámos algumas empresas a expandir o seu negócio e a sustentar a sua atividade e distribuição na CARF.
Para além dos grossistas de peças, pneus e chapa, que outro tipo de clientes têm atualmente?
Clientes de pesados, vidros e lubrificantes. Trabalhamos também com concessionários. E também com operadores logísticos que armazenam as peças, principalmente peças originais, onde a CARF faz a distribuição para esses operadores. Ao longo destes 15 anos conseguimos criar a nossa marca, e identificámo-nos como uma empresa focada neste setor. E até à data não há nenhuma empresa concorrente que tenha a nossa dimensão. Neste momento, a nível de abrangência do território, somos a única transportadora que consegue servir a 100% o cliente.
Quais as principais dificuldades que encontram na vossa atividade?
O mercado está em evolução constante, e por isso temos de estar sempre a antecipar. Isto é o que temos feito ao longo destes 15 anos: reagir de acordo com as necessidades do mercado. Há três anos percebemos que temos de ir ainda mais além e por isso estamos a preparar algumas coisas para reagir, porque alguns clientes começam a ter novas estratégias: estruturas próprias, viaturas dedicadas, ou seja, uma inversão no mercado. Estamos expectantes, porque acreditamos que estão a criar custos, mas temos de reagir. Temos uma estrutura muito grande, que nos permite ter uma capacidade de resposta em torno do que o cliente precisa, sem ter custos exagerados. O nosso foco está sempre na redução de custos do cliente.
O negócio tem vindo a evoluir? A CARF transporta cada vez mais peças?
Neste momento não notamos que se transportem mais peças. Tivemos períodos em que notávamos que o tipo de mercadoria que circulava não era tanto o material de desgaste, mas de mecânica. Viemos de uma situação muito recente, em que se vendia pouco. Mas parece-nos que existe uma fragmentação da venda, transportamos mais, mas isso não representa necessariamente que os clientes estejam a vender mais.
O mercado suporta a quantidade de operadores de peças como existem atualmente?
Temos bons importadores, cada vez têm mais força e cada um está a optar pela sua estratégia, tal como o aparecimento de muitas redes de retalho, mas não existem demasiados operadores. É a evolução do mercado, os operadores são os mesmos, não há novos, mas estão a concentrar-se. Acredito que os retalhistas estejam mais ameaçados do que os grossistas.
Como perspetiva a evolução da CARF nos próximos anos?
Terminámos o ano com muitos contactos de clientes novos e perspetivamos 2019 de forma otimista. Saímos de um problema relativamente recente e que abalou a estrutura da empresa, mas neste momento estamos tranquilos com o nível de serviço e de operações que temos, com a qualidade do serviço e com aquilo que estamos a planear para o futuro, quer a nível nacional, quer internacional. O internacional foi pensado desde a entrada no Grupo Totalmédia e é algo que queremos desenvolver rapidamente. E 2019 poderá trazer-nos novidades em termos de operações para Espanha.
Mário Carvalho
A principal tipologia de cliente da CARF são os grossistas de peças…
Sim. São e continuam a ser os principais clientes. Temos dois alvos distintos: o alvo comercial e o alvo operacional. O alvo comercial é o grossista e o alvo operacional é o retalhista.
O que é que hoje é crucial na vossa atividade para que a peça seja entregue a horas?
Essencialmente é algo que tentamos passar para o mercado: quanto mais rigoroso for o cumprimento dos horários de recolha, mais rigorosos serão os horários de entrega. O processo começa na casa de quem vende, e isso é crucial. Tem de haver responsabilidade por parte de todos, porque, por mais meios que tenhamos, nunca vamos conseguir compensar eventuais atrasos. Porque quando um que atrasa, tudo o resto atrasa. E a solução não é colocar mais meios, porque nós temos os meios bem ajustados aos produtos e quantidades que transportamos.
Sempre que uma peça não é entregue a horas, como se resolvem os problemas?
A logística é um negócio que gera, tipicamente, insatisfação. O mercado, como um todo, não está preparado para lidar com imponderáveis. Se tivermos um nível de serviço de 95% ou 96%, está próximo do perfeito. Mas estes 3%, dado o volume de entregas que fazemos, são uma imensidão de problemas que a nossa equipa tem de resolver com vários clientes.
Qual o nível de satisfação do cliente?
Atualmente ronda os 97%. Mas é muito complexo medir o nível de satisfação.
O que representam atualmente os pneus para a CARF?
Neste momento, 42% dos volumes transportados são pneus. Este produto veio nivelar a dispersão da nossa entrega, porque tínhamos as entregas mais concentradas na tarde, e os pneus vieram equilibrar a balança. Atualmente já não é assim, mas na altura foi o que aconteceu.
Os pneus foram um acelerador do negócio das peças?
No fundo, as peças retiram dividendos deste ajuste da estrutura CARF, derivada da entrada do negócio dos pneus. Há um equilíbrio da atividade entre peças, chapa e pneus.
Como avalia o negócio da logística de peças em Portugal?
A exigência do cliente mudou, hoje em dia a profissionalização do setor das peças já leva os clientes a não trabalhar com empresas não tão profissionalizadas. Ultimamente penso que têm desaparecido mais empresas do que as que surgem. Temos de cumprir uma série de critérios legais e o setor é regulado. O que está a acontecer nas peças é o que já aconteceu nos pneus, uma “overdose” de serviço, várias entregas por dia. E quando chegar à altura das contas, haverá um retrocesso.
Acredita que irão existir entregas via drone no futuro?
A volumetria e o peso dos produtos, em princípio, não irá permitir isso. Só quando os drones evoluírem, por forma a que seja possível esse tipo de entregas.
Perfil
Paulo Carvalho está ligado ao setor das peças há 26 anos, tendo começado numa casa de peças como estafeta. Passou depois pela Salvador Caetano e pela Sintra Peças. Mais tarde colaborou com a Autozitânia e depois com a Imporpeças, antes de fundar a CARF.
Perguntas rápidas
Qual foi o seu primeiro carro?
Foi um Austin 850.
Quantos quilómetros faz por ano?
Cerca de 50.000 km.
O que mais gosta neste setor?
O facto de não ter dois dias iguais.
E o que menos gosta?
Da falta de reconhecimento pelo trabalho que a CARF tem feito.
Considera importante ir ao mercado visitar os clientes?
Sim, continuo a fazê-lo, é muito importante aparecermos nos bons e maus momentos.
O que gosta de fazer nos tempos livres?
Gosto de andar de mota, e de conviver com os amigos e família.
Artigo publicado na Revista Pós-Venda n.º 40, de janeiro de 2019. Consulte aqui a edição.