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Personalidade do mês – João Jervell, Civiparts: “Temos a digitalização plena do negócio, desde que a peça sai da fábrica até chegar ao cliente”

João Jervell está à frente do processo de restruturação da operação da Civiparts, que concentra o stock em grandes armazéns e reduz o número de pequenas lojas no nosso país.

Com uma posição de grande destaque no mercado de pesados, a Civiparts tem vindo a implementar, nos últimos meses, uma nova forma de operar, com uma presença menos capilar no mercado, mas com processos logísticos mais ágeis e eficientes, por forma a beneficiar a sua rentabilidade e o serviço aos seus clientes. João Jervell, Diretor Executivo da Civiparts, explica à REVISTA PÓS-VENDA PESADOS os motivos da mudança e a forma como está a ser implementada esta nova estratégia na Civiparts.

Como caracteriza atualmente a Civiparts?
A Civiparts é hoje uma operação diferente do que foi nos últimos 40 anos, mas continua a ter uma presença incontornável em Portugal. Estamos a comemorar este ano o nosso 40.º aniversário e, desde o início que baseamos a nossa existência em relacionamentos duradouros e na capacidade de manter a confiança daqueles com quem trabalhamos. Isto é e sempre foi a base do sucesso da empresa. A Civiparts, apesar de ser uma empresa de grandes dimensões, nunca procurou incessantemente essa posição. O que pretendemos sempre é ser a empresa mais eficaz, a mais rápida e a que tem confiança das pessoas com quem trabalha. E esses valores mantém-se todos atualmente.

O modelo dos últimos anos da Civiparts foi-se alterando, e hoje é substancialmente diferente. Qual o ponto da situação atual?

Olhámos para o mercado, observámos as tendências, e vimos qual era o modelo que acreditamos que vá vingar no futuro e que, sobretudo, seja o modelo que vá ao encontro daquilo que são os pilares da empresa. Assim, dimensionámos a nossa operação e, neste momento, a Civiparts mantém-se em dois mercados: Portugal e Angola. Em Espanha, vendemos a operação no ano passado, pois percebemos que o negócio tinha variáveis que dificilmente se iam alterar e que impediam o crescimento de players como a Civiparts. Em Portugal, tínhamos uma estrutura de lojas que ia de Braga a Faro, e resolvemos fazer um ajuste, em função do modelo de negócio que implementámos no final de 2021, e que se baseia em ter locais de armazenamento muito mais robustos. Temos agora um armazém central muito forte e os dois armazéns, em Lisboa e Porto, com uma operação muito forte e com uma distribuição com grande capilaridade, através dos nossos parceiros. Mantemos pequenos retalhistas de peças em alguns locais, temos lojas em Lisboa, Porto e Leiria. As restantes lojas foram vendidas ou encerradas. A Civiparts é uma grande empresa, mas o país tem dimensões limitadas, e ate no contexto do Grupo Nors, a Civiparts é uma operação com uma dimensão pequena, que representará cerca de 6% da faturação do grupo. E, por isso, tínhamos de definir um modelo de futuro, que fosse sustentável, rentável, que fosse igualmente aceite por clientes e fornecedores, envolvendo-os a todos
nesse modelo.

A compensação do fecho das lojas foi o investimento que fizeram nos armazéns de Lisboa e Porto?
Sim. Fizemos um investimento grande nos últimos anos, para possibilitar todas estas alterações. Há vários anos que vínhamos a fazer este investimento, nomeadamente numa tecnologia de base que possibilitasse a digitalização do negócio e a reformulação de alguns processos logísticos, de acordo com as melhores práticas do setor logístico. Olhámos para a operação e tentámos perceber de que forma a podíamos rentabilizar da melhor forma, porque aquilo que pretendemos é ser bons no contexto logístico, da operação. O nosso stock manteve-se, mas, aquilo que conseguimos foi colocá-lo mais rapidamente no cliente, o que para nós é fundamental. O nível logístico que temos atualmente é superior ao que tínhamos. Provámos que, pelo facto de a peça estar numa loja próxima, não significa que o cliente a vá receber mais rapidamente. Neste momento, o nosso sistema logístico assegura duas entregas diárias a nível nacional. O que nos
interessa verdadeiramente é ter a agilidade, mantendo níveis interessantes de stock, e ter a peça rapidamente no cliente.

A perda de proximidade teve então um impacto positivo?
Sim. Temos dois indicadores para medir o impacto: em primeiro lugar, a satisfação dos clientes e, em segundo lugar, o aumento das vendas. Nos três primeiros meses deste ano, com o novo modelo, temos um aumento de vendas face ao ano passado. E isto aconteceu com menos cinco lojas. Obviamente que estamos muito satisfeitos com a alteração que fizemos e com o modelo que implementámos. É um modelo que acreditamos que vá vingar, o “figital”, ou seja, ter uma estrutura de base digital que permita fazer o acompanhamento da peça desde o momento em que sai do fornecedor até chegar ao cliente, mas ter presença física, através de grandes armazéns e locais de distribuição.

A concorrência pode ver a saída da Civiparts de certas localizações como uma oportunidade…
Vejo a concorrência com naturalidade. Acredito que as variáveis do negócio se estão a alterar, e existem alguns indicadores que nos permitem pensar que o modelo que implementámos será o modelo ideal no futuro, em vez de um modelo de enorme capilaridade, através de lojas, com acréscimo de custos com instalações. O modelo dos últimos anos punha muitos custos na operação e retirou margem ao negócio, e, por isso, tinha de ser repensado. Temos a capacidade de servir melhor com o modelo que estamos a implementar. Trabalhamos num ambiente que envolve sinergias com clientes e fornecedores, e creio que perceberam o modelo que estamos a implementar.

Algo que se fala muito no setor é o serviço ao cliente. Qual a posição da Civiparts neste aspeto?
Com este novo modelo, aumentámos o nível de serviço ao cliente, as vendas, temos rácios de não conformidade completamente marginais, na casa dos 0,2%. Temos a digitalização plena do negócio, desde o momento que a peça sai da fábrica até chegar ao cliente. Neste momento conseguimos medir toda a operação, e isto é fundamental para a podermos gerir. O investimento que foi feito e também o que prevemos fazer, que irá ser igualmente substancial. Vamos ter boas notícias nos próximos anos da Civiparts no aftermarket.

Que outras mudanças foram implementadas com esta restruturação?
Desde o dia 4 de abril foi criada uma estrutura única, que dá suporte a todas as áreas de aftermarket do grupo. Em termos de backoffice, todo o negócio de peças, de ligeiros e pesados, passou a ser gerido por apenas uma entidade, a NewOneDrive, que agrega a Civiparts, a ASParts e a OneDrive. Não fazia sentido ter duplicação de stocks, de gestão de produto, que são operações muito semelhantes em todo o grupo. As equipas estão integradas e o modelo logístico, de operações, é praticamente igual. Mas as marcas mantém-se completamente independentes, as estruturas comerciais mantém-se autónomas, porque os setores são diferentes. O que foi fundido foi apenas a componente que não é visível, por uma questão de simplificação operacional. Toda a comunicação se mantém independente, as marcas vivem só por si e têm um enorme património. Destaco o enorme entusiasmo com que as nossas equipas têm vivido este processo de transformação, que tem sido trabalhado não só pela empresa, mas por todos os seus parceiros. O seu envolvimento neste processo tem sido fundamental para a mudança que foi implementada nos últimos meses.

Um dos vossos parceiros, a Groupauto, ajudou a empresa a desenvolver-se,
nomeadamente ao nível das redes oficinais. Atualmente há outros operadores com semelhantes compromissos com a Groupauto. O que representa isto para a Civiparts?
Vemos a incorporação de novos membros na Groupauto com muita naturalidade. A incorporação faz com que o grupo tenha mais força no mercado. Nos últimos anos, alguns grupos concorrentes da Groupauto têm vindo a crescer no mercado ibérico e, por isso, é normal que a Groupauto pretenda também manterse competitiva. Nas redes oficinais, a TopTruck e a TopCar continuam a ser exclusivos do grupo. O conceito oficinal agrega valor aos clientes, as parcerias que disponibilizamos continuam a ser uma grande mais valia para quem adere à rede. E a Groupauto tem outros conceitos oficinais para veículos pesados.

A rede TopTruck está estabilizada? Quanto representa na operação da Civiparts?
Sim. O conceito de rede TopTruck é fundamental para a Civiparts. Temos, neste momento, 19 oficinas, e apenas queremos incluir mais se realmente acrescentarem valor. Estamos muito satisfeitos com a rede que temos, temos vindo a crescer ano após ano nas vendas para a rede. Tivemos a vantagem de ser o primeiro conceito de rede oficinal independente para camiões, e por isso conseguimos ter as melhores em Portugal. A rede tem uma expressão muito forte na empresa, representa entre 10% a 15%, e temos acima de 4000 clientes ativos. E cada vez mais, face à disrupção que existe no setor, face à informação dos veículos, temos de apostar na nossa rede, é a salvaguarda do nosso futuro.

Houve alguma alteração na política de marcas e produtos da Civiparts?
Temos um posicionamento de produto sempre premium e representamos praticamente todas as grandes marcas do aftermarket de pesados. Não privilegiamos o mais barato, mas sim o Smart buy, ou seja, aquele que tenha uma boa relação preço/qualidade. A Sampa, por exemplo, assim como a nossa marca própria ALEA, inserem-se no conceito Smart Buy. Relativamente à incorporação de outras marcas, há um dinamismo natural, pois o parque altera-se. As marcas com que trabalhamos são verdadeiros parceiros, a integração delas com o nosso negócio é fundamental e é o que nos permite sinergias e conseguir uma operação eficiente. Temos parceiros de longa data, com quem trabalhamos desde o surgimento da empresa, e com quem nos orgulhamos de trabalhar. E não os deixamos de questionar, de desafiar e de partilhar com todos a nossa forma de estar no mercado.

Pretendem continuar a investir na ALEA?
Sim. A ALEA continua a ter uma grande expressão na Civiparts, representa quase 10% do negócio de peças, mas está ainda aquém daquilo que queremos chegar com esta marca. A marca foi sofrendo alterações desde que surgiu há 10 anos, quer ao nível das gamas que disponibiliza, quer ao nível da origem dos fornecedores. Temos agora um time to market muito mais rápido na ALEA e o investimento faz parte da estratégia da Civiparts.

Como vê os grandes investimentos que têm sido feitos no setor das peças de pesados?
No caso da Civiparts, o investimento não é em instalações, mas sim noutras áreas que não se veem, mas que se sentem na operação. Todas as operações, quer nossas, quer dos concorrentes, sentem a disseminação que existe em algumas zonas, ao nível das casas de peças. E obviamente que, havendo maior número de casas de peças, haverá maior tendência para transferir valor para clientes. Sentimos que isso, no caso da zona de Leiria, por exemplo, já está saturado. O que pode acontecer, no mercado nacional, é um ajuste. Acredito que o 2023 vai ser clarificador do futuro do negócio. Penso que, até 2030, vamos assistir a um acelerar do ritmo de alterações no setor automóvel e no aftermarket. No caso do mercado nacional, penso que haverá uma clarificação de qual será o modelo que se irá manter no futuro.

Alguma concorrência chega de Espanha. Nota uma iberização do mercado?
Ainda não existe uma iberização do mercado tão evidente nos pesados como acontece nos ligeiros. Há dois players de Espanha a operar em Portugal há vários anos, mas há poucas empresas capacitadas para procederem à iberização do mercado. Apesar de algumas já estarem fisicamente em ambos os mercados, as estruturas não são únicas, são ainda estruturas muito robustas, não sendo verdadeiramente multinacionais. Acredito que a iberização vai acontecer quando houver a consolidação que todos esperamos do mercado ibérico, tal como aconteceu em alguns países do norte e leste da Europa. No mercado ibérico temos ainda uma estrutura com muitas pequenas e médias empresas.

Artigo publicado na Revista Pós-Venda n.º 39 de abril/maio de 2022. Consulte aqui a edição.

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