Ver todas

Back

Personalidade do mês – Paulo Almeida, RPA: “Temos de ser competitivos em preço, mas se não tivermos as melhores equipas, o negócio não tem sucesso”

Paulo Almeida tem sido um dos pilares do crescimento da RPA e, mesmo apesar da pandemia, tem encontrado estratégias para que a empresa ofereça um serviço mais completo e de proximidade aos seus clientes.

Com quase 25 anos de existência, a RPA – Rui & Paulo Almeida é hoje um dos maiores retalhistas de peças da região da grande Lisboa. A estratégia da empresa tem passado por estar cada vez mais próxima dos seus parceiros, com a aposta na digitalização e em produtos e serviços que vão ao encontro das necessidades das oficinas, assim como a aposta na expansão geográfica, com a abertura de novas lojas, mas também na eficácia do seu sistema de logística, para melhor servir os seus parceiros. Paulo Almeida, gerente da empresa, revela à REVISTA PÓS-VENDA de que forma a RPA está a aplicar estas novas estratégias, e qual o rumo que pretende seguir nos próximos anos.

Como definiria hoje a RPA?
A base da RPA é vender peças, e continua a ser. Mas, hoje em dia, temos de acrescentar mais à venda. Antigamente, vendia-se a peça e estava feito o negócio. Atualmente, é necessário acrescentar valor à peça, com serviços agregados como o call center, a formação, o apoio técnico, as plataformas B2B ou os dois conceitos oficinais que dinamizamos. Tudo isto acrescenta valor ao produto que é vendido. A peça é fundamental, mas é importante olhar também mais para o serviço. Somos um retalhista, e queremos cada vez mais subir no patamar do retalho. Temos uma enorme capacidade de stock, para além das outras lojas que temos. Não somos importadores, mas queremos passar para a parte de importação, porque é isso que nos dá margem. Queremos ter as marcas diretamente, porque o segredo está, cada vez mais, na compra, e não na venda. O importante é o preço a que compramos o material, assim como a rapidez da logística, que é outro dos desafios atuais que temos. Neste momento, estamos com um projeto para reestruturar toda a logística da empresa, analisando todo o processo, para perceber onde podemos melhorar. Investimos num gestor de produto, porque vimos que há necessidade da gestão de produto, que é tão importante como a logística. A logística pode estar bem montada, mas o gestor de produto é um complemento, porque percebemos que as empresas têm de ser mais profissionais e de ter um grau maior de gestão do negócio.

A vossa compra é feita ainda maioritariamente aos grossistas?
Já temos uma grande percentagem de compra às fábricas, algo que tem vindo a crescer gradualmente. Não somos um importador e não é esse o nosso core, pelo menos para já. Vamos ter sempre fornecedores logísticos em Portugal. Mas queremos cada vez mais importar marcas e fazer a diferenciação, através de marcas que não existem em Portugal, como foi o caso da marca italiana AVS Autoparts. Metade da nossa venda de filtragem já é AVS Autoparts. E com as marcas próprias pretendemos diferenciar-nos, mantendo sempre a qualidade, não queremos produto de baixa qualidade.

Com a marca de peças exclusiva GreenParts, a que gamas de produto pretendem chegar?
Apostámos recentemente na GreenParts, uma marca que já tivemos e à qual foi feito um rebranding, é uma linha RPA, na qual atualmente temos uma gama de consumíveis. A Motul descontinuou alguns produtos, que eram importantes na empresa, e vimos que, com a GreenParts, conseguimos ter o mesmo produto com a mesma qualidade. Especializámos a GreenParts nesse produto, e a ideia depois será crescer para outras linhas. Neste momento temos uma linha completa de anticongelantes, tanto genéricos como específicos, com 12 referências. Temos também a parte de higiene de oficinas, areias de chão, etc. Queremos, no futuro, colocar mais produtos, mas irá depender das necessidades. Temos alguns produtos em mente, mas não está ainda 100% definido.

Estando na região como Lisboa, têm de enfrentar a concorrência de alguns grossistas que estão a fazer venda direta à oficina…
O mercado está a ficar um pouco desvirtuado, mas tem sido uma tendência crescente. Penso que isto acontece por falta de argumento, porque grande parte desses grossistas não têm para lá da peça. E, se só vendo peça, sou mais competitivo, mas se calhar daqui a 10 anos não estou no mercado. E com a presença das entidades espanholas em Portugal é algo que acontece ainda mais. Mas o nosso mercado é muito resiliente, muito diferente do espanhol. Temos visto a entrada de alguns operadores espanhóis que adquiriram ou se associaram a empresas portuguesas.

Têm acompanhado esta evolução do mercado?
Sim, temos tido algumas reuniões e estamos à procura de parcerias. No futuro, será muito mais duro fazermos o caminho sozinhos, mas ainda não encontrámos a parceria certa. O problema dos grandes grupos é a disparidade entre as empresas, que estão em diferentes patamares, e isto dificulta o crescimento. Se criarmos um grupo com empresas mais homogéneas, em que estão todas ao mesmo nível, com a mesma visão, será mais fácil que o grupo cresça.

Há dois anos apostaram na academia de formação. Como tem corrido este projeto?

A formação vem agregada aos conceitos de rede. Fizemos webinars durante o período de confinamento, ao sábado de manha. Mas o nível de captação foi muito baixo, o que é desmotivante: lançámos o tema de gestão oficinal, resíduos nas oficinas, liderança, por exemplo. São temas muito importantes, e estas formações eram gratuitas. No caso da academia de formação, 90% das formações são pagas, as únicas gratuitas são as mais técnicas, das marcas. E dinamizamos esta formação em duas zonas do país.

Lançaram também dois conceitos oficinais…
Sim, o Xpert Service e a 2Drive. O Xpert Service está muito bem pensado, e foi criado para chegar às necessidades das oficinas. É um conceito muito ambicioso, exigente, para quem quer estar no mercado daqui a 10 anos, mas que obriga a mudar a mentalidade de quem está a gerir a oficina, porque tem muita gestão agregada. Começámos com oito membros e, com a pandemia, dois fecharam portas. Este conceito mantém-se, mas criámos a 2Drive, que é uma solução mais low cost. Na Xpert Service temos agora uma oficina, e temos três contactos que assinaram pela 2Drive – que tem atualmente 18 oficinas – mas que irão subir para a Xpert Service. Acreditamos que o futuro vai passar pelas redes oficinais. A tendência é o utilizador não ser o dono do carro e, para termos estes clientes, temos de ter dimensão e capacidade, porque sozinhos não conseguimos chegar às grandes frotas, que irão representar uma percentagem do negócio cada vez maior. Chegar às grandes frotas é importante, mas também o tema do automóvel, porque, no futuro, ou estamos ligados a fontes com informação, ou então será muito difícil mantermo-nos no mercado. Se as informações forem partilhadas, o custo será muito inferior.

Além da formação e redes oficinais, que acrescentam à venda da peça?
A forma como comunicamos com o cliente. O nosso call center evoluiu muito, e isso tem dado uma dinâmica muito grande ao negócio, assim como o WhatsApp. Mas ainda há muitos clientes a trabalhar com o telefone. Mas temos tido um grande crescimento na plataforma B2B, que temos há cerca de dois anos. Está mais intuitiva e tem evoluído muito. Já temos muitas oficinas a utilizar e todos os meses a percentagem de utilizadores tem subido.

Que análise faz do desenvolvimento técnico das oficinas independentes com que trabalham?
O nosso tecido empresarial nas oficinas está muito envelhecido. Temos uma média de idade relativamente alta versus a regeneração. Temos oficinas em decadência, mas também temos alguns jovens a investir e com bastante ambição. Um dos grandes problemas são os casos em que o negócio não tem sucessão e em que, por isso, não há investimento por parte das oficinas.

As oficinas estão preparadas para a evolução tecnológica que se aproxima, em termos de telemática associada aos veículos?
A nova geração está mais atenta a tudo isso. Estamos a tentar fazer essa mudança também, com as formações, os conceitos oficinais, etc., para ajudarmos as oficinas a terem o melhor apoio possível, porque o seu sucesso é o nosso sucesso. Penso que o futuro não passa pelos elétricos. Os veículos com energias alternativas já são quase 26% das vendas hoje, mas não são os 100% elétricos. Esses representam uma percentagem muito baixa. Mas os carros a combustão, com outro tipo de energia associada, requerem outro tipo de conhecimento.

A RPA poderá entrar no negócio das oficinas de colisão, comercializando produtos como tintas, equipamentos, lixas, etc.?
Já nos foi oferecido isso, mas não havia viabilidade de margens para trabalhar esse tipo de produtos. Há especialistas neste setor e é um mercado muito agressivo. É como a área dos pneus, na qual também nunca equacionámos entrar, pelo menos até ao momento.

Hoje em dia têm 5 lojas, pretendem estar em mais localizações?
Temos projetos de crescimento, queremos abrir novas unidades, mas ainda não está decidido onde. Para montar uma operação com logística é importante haver um estudo, mas é um projeto que não vai parar por aqui. A nossa estratégia não irá passar por nos mantermos tão próximos de Lisboa como nas lojas que temos atualmente, mas, obviamente, onde exista densidade populacional que o justifique. O segredo é conseguirmos ter as equipas certas nos locais certos. Temos de ser competitivos em preço, mas se não tivermos as melhores equipas, o negócio não tem sucesso.

Como vê um moderno retalhista de peças, a médio e longo prazo?
Em dois anos, o nosso mercado mudou radicalmente devido à pandemia. Transformou-se digitalmente de forma muito rápida. As pessoas viraram-se muito rápido para a compra online, mas a profissionalização no B2B é algo que tem sido complexo, porque há muita rigidez nas oficinas para se modernizarem. Uma empresa como a RPA tem como estratégia “dar o salto”, fortalecer-nos, com mais vendas e criação de valor. Temos dificuldade em perceber o que vamos ser daqui a dois ou tês anos, porque a pandemia deixou-nos com receio de antecipar o que virá nos próximos anos. Sabemos o que queremos e temos um plano, mas nenhum plano a três ou cinco anos poderá ser realizado sem alterações.

Qual a razão para este setor ser tão resiliente?
O setor vive dos momentos de crise, dos momentos em que há um maior número de carros com mais idade. Em 2012, a crise fez com que a venda de novos caísse e aí o aftermarket disparou. E penso que agora será um pouco semelhante. Vivemos de quilómetros, e este mercado, apesar de agora percorrer agora menos quilómetros, tem mais veículos por família. Além disso, o facto de os veículos estarem mais tempo parados, causa problemas em componentes caros, como filtros de partículas, por exemplo.

Percurso profissional
Paulo Almeida tem feito todo o seu percurso profissional na RPA, fundada pelo seu pai, Armando Henriques Almeida. A empresa começou com uma oficina, tendo-se expandido entretanto para casa de peças e outras áreas de negócio. Paulo Almeida desenvolveu o negócio das peças, tendo investido mais tarde num armazém central, coordenando também todos os serviços financeiros do grupo.

Artigo publicado na Revista Pós-Venda n.º 70 de julho de 2021. Consulte aqui a edição.

PALAVRAS-CHAVE