A estratégia de Nuno Lopes à frente do serviço pós-venda da Fiat Chrysler Automobiles em Portugal passa pela consolidação do digital, com a oferta de serviços novos e diferenciadores, para simplificar processos e fidelizar o cliente.
ENTREVISTA PAULO HOMEM E NÁDIA CONCEÇÃO FOTOS MICAELA NETO
Depois da consolidação da vasta rede de distribuição em Portugal com presença em todos os distritos, a FCA aposta agora na diferenciação através da implementação da tecnologia nos serviços pós-venda, para se diferenciar e inovar no serviço ao cliente.
Qual o ponto da situação atual da rede, depois do último investimentos na zona de Trás-os-Montes?
Com o último investimento, a Auto Sabor em Trás-os-Montes, concluímos a cobertura de todos os distritos. Neste momento temos 36 concessionários, e mais 11 subconcessionários, que se localizam onde consideramos que a capilaridade é mais importante. Ou seja, temos 47 pontos de assistência, nem todos têm todas as marcas do grupo, mas a cobertura é global. Algo que já tínhamos tido nos anos 90, com a particularidade de termos agora integrado a Jeep, a Chrysler e a Dodge.
A rede está estabilizada?
Sim. Bragança era o único “open point” que tínhamos em termos de distrito, e neste momento temos a rede perfeitamente estabilizada e com a quantidade de oficinas necessárias por densidade de parque circulante, não estando prevista mais nenhuma. E isto deve-se também à presença dos subconcessionários. Estamos num patamar de maturidade e cobertura geográfica interessante. Os estudos de georeferenciação que fazemos em termos de localização de clientes e de pontos pós-venda permitem-nos ter a certeza de que a cobertura é a adequada para as necessidades do cliente. Depois de um processo de alteração de rede, 2018 foi um ano de estabilidade, dentro da cobertura que tínhamos idealizado e um ano em que as alterações de volume de negócio assentaram num pressuposto estável de rede.
Todas essas estruturas têm serviço pós-venda associado?
Sim, as 36 de primeiro nível e as 11 de subconcessionários, todas têm pontos de pós-venda: serviço, peças e na maioria também reparação de carroçarias. Toda a nossa rede assume responsabilidade da reparação de chapa e pintura, sendo que em alguns casos isto é feito através de centros de colisão.
Toda a rede está habilitada a dar assistência a todas as marcas?
Não. Temos dois tipos de cobertura, a global, com as marcas todas, e essa está presente no pós-venda em todos os distritos, exceto Beja. E temos depois, em todos os pontos que mencionei, a Fiat, a Fiat Professional e a Abarth. A Alfa Romeo e Jeep é que não estão no distrito de Beja, Castelo Branco, Guarda e Bragança.
Todas as unidades fazem colisão e pneus?
Sim, praticamente todos fazem, mas nem todos fazem ainda o serviço de pneus da forma que pretendemos. Temos algumas unidades que o fazem de forma subcontratada. Algumas concessões mais pequenas ainda não têm stock e equipamento. Por isso, podemos dizer que, genericamente, temos oferta de pneus, mas é ainda uma área de crescimento em algumas unidades.
Haverá novidades este ano na parte oficinal?
Em termos de cobertura de rede não. Mas destaco outro aspeto relacionado com a cobertura, não geográfica, mas em termos de serviço, nomeadamente o alargamento de horários de funcionamento e, sempre que possível, a abertura aos sábados. Na concorrência, a questão do horário de funcionamento, para alem da localização, é uma questão de diferenciação, e por isso o desafio para 2019 é conseguirmos um número significativo de pontos de pós-venda com abertura aos sábados.
Para o cliente particular ou profissional…
A inclusão das marcas Chrysler, Jeep e Dodge tornou-nos num grupo que tem toda a tipologia de clientes, com vários tipos de utilização. Desde a Fiat Professional, com uma utilização em que os períodos de imobilização têm de ser geridos de forma diferente e onde a abertura aos sábados desempenha um papel que tem de ser complementado com os horários alargados, passando pelo cliente Jeep ou Fiat 500, com uma utilização principalmente urbana, e para os quais o conseguir reparar ao sábado, recorrendo a veículo de cortesia, é outro dos aspetos em que temos que nos diferenciar. Queremos e tornamos cada vez mais acessível a todos os clientes a possibilidade de utilizarem um veículo de substituição numa marcação efetuada com essa opção prévia e oferecer escolhas diferentes, para que o cliente possa utilizar essa oportunidade para conhecer outra parte da gama ou outra marca.
Haverá mais novidades, para além dos horários alargados?
O desafio que colocamos em 2019 tem que ver com a dinamização de toda a aproximação digital do cliente à nossa rede. O facto de se conseguir fazer uma marcação de serviço a qualquer hora e tornar essa marcação o mais autónoma possível, é um dos caminhos a desenvolver. As outras componentes da ligação digital que têm que ver o cliente ter acesso à estimativa do custo da operação e a fácil marcação de veículo de substituição. A nossa rede tem agora também um site institucional da concessão. Isto implica, não só desenvolvimentos de informática, mas também um alinhamento de toda a organização no comportamento para com o cliente e na divulgação. Outra área, ligada à parte digital, tem que ver com o MOPAR Connect, que liga o cliente ao veículo. Para quase toda a gama de veículos vendidos desde 2016, o cliente pode adquirir uma MOPAR Connect Box, um equipamento que é colocado no veículo, e através de uma aplicação no telemóvel, a UConnect Live, consegue gerir vários serviços relacionados com a utilização diária e com serviços pós-venda, como por exemplo a possibilidade de localizar um concessionário e obter alertas de serviço. Estamos a colocar o conceito de Internet das Coisas (IoT) ligado à telemetria dos veículos. Para além do cliente particular que faz a utilização da aplicação e a empresa que controla os veículos da frota, podemos também fornecer dados avulso ao cliente, no caso de uma frota ou rent-a-car que gere veículos de várias marcas e que não prescinde do seu software. A diferença para o e-call é que com este conceito não só permitimos a clientes com veículos comprados há mais tempo o utilizem também, como agregamos um conjunto de serviços a esta tecnologia, não nos limitando à questão do acidente. Para os veículos novos, é um opcional. Mas a grande mais-valia é a possibilidade de se fazer o retrofit.
O aumento do parque circulante refletiu-se no número de intervenções em oficina?
Sim. O Grupo FCA desenha o negócio para o parque circulante de 0 a 10 anos, que são 135 mil automóveis, de um total de 570 mil. E 14% das entradas em oficina são feitas em carros com mais de 10 anos, ou seja, temos uma retenção de clientes interessante. De 2017 para 2018 o parque circulante cresceu cerca de 3%, e as entradas em oficina cresceram acima disso.
Como tem evoluído a taxa de fidelização ao pós-venda?
Tem vindo a aumentar, mas temos de separar as várias marcas. A Jeep tem uma realidade diferente, com quilometragens e frequências de utilização distintas. Depois temos a fidelização dos veículos comerciais com quilometragens elevadas e também a Fiat, onde o cliente típico se alterou e atualmente é um cliente mais jovem, com novas expectativas de serviço. E, portanto, os nossos desafios entram exatamente aí: conseguir ter um modelo de comunicação com o cliente, adequada a todos os tipos de cliente.
O que é o conceito MOPAR?
A MOPAR começou nos Estados Unidos em 1937, para a Chrysler, Jeep e Dodge, onde tem uma notoriedade muito relacionada com a preparação de veículos. Com a fusão dos grupos Fiat e Chrysler, a MOPAR foi integrada como marca do pós-venda. O processo ficou concluído em 2017. O conceito de ter uma marca para o pós-venda que não tenha necessariamente como objetivo produzir e comercializar um produto alternativo com um posicionamento de preço diferente, porque não é este o conceito da MOPAR, não existe na Europa. E o percurso que temos vindo a fazer é o de divulgação de que a MOPAR é o chapéu para todo o pós-venda das marcas.
O que representa a MOPAR do ponto de vista operacional?
Tudo aquilo que tem que ver com produtos e serviços de marca, ou seja, extensões de garantia, contratos de manutenção, extensão de assistência em viagem, pacotes de mudança de óleo e outros produtos que temos no âmbito da fidelização, são produtos MOPAR VEHICLE PROTECTION. É uma marca do grupo FCA, de serviços pós-venda, e todas as peças originais das nossas marcas são MOPAR. Outras marcas criaram marcas de pós-venda que têm objetivos diferentes do objetivo da MOPAR. Também temos outro tipo de produtos, dentro da MOPAR, com o conceito Classic Service, onde temos gamas de peças com posicionamento de preço diferente para veículos com mais de cinco anos. Outro aspeto que é importante tem que ver com outros produtos que comercializamos, para além das peças originais, em produtos como o AdBlue, equipamentos de oficina e consumíveis relacionados com a área de colisão, ou seja, tudo o que tem que ver com a reparação. A MOPAR pretende ser um fornecedor global para o concessionário e com isso simplificar o negócio e aumentar a rentabilidade.
Os concessionários podem propor tudo isso ao cliente, quando adquire um veículo?
Sim, novo ou usado. Uma das áreas de atuação da MOPAR em 2018 na fidelização do cliente teve que ver com uma parceria com a atividade dos usados, ou seja, todos os usados comercializados na nossa rede têm extensões de garantia MOPAR, sem limite de quilometragem e em que a cobertura é muito semelhante à garantia contratual. É uma área em que a rede é bastante dinâmica, mas que era explorada por terceiros. E é algo que tem sido bastante reconhecido por parte da rede e do cliente.
Existem peças MOPAR para veículos mais antigos?
Sim. A Fiat teve a Classic Line, que evoluiu para as Essential Parts, com o mesmo conceito mas com um posicionamento de preço mais vantajoso, uma cobertura para veículos com mais de cinco anos e um maior portfolio de produtos, incluindo alguns mais técnicos. Quando falamos com parceiros de negócio, na venda de peças B2B, a Essential Parts é uma terminologia utilizada. No caso do cliente oficinal falamos em Classic Service, com preços fechados de mão de obra, peças e IVA, e aquilo que está no pacote de serviço são peças Essential Parts.
Como está estruturado o negócio de peças MOPAR?
Distinguimos dois tipos de concessionários: os que têm uma atividade comercial ativa e investimento na distribuição de peças no exterior, e os concessionários que têm um balcão de peças público, onde fazem a venda a profissionais ou particulares, sem dinamização comercial. Na nossa rede existem cinco concessionários comercialmente mais ativos, com equipas comerciais dedicadas, call center e site para encomenda de peças. Se juntarmos as duas realidades, ficamos com um perfil de comercialização que ronda cerca de 70% para oficina e 30% na venda externa. Nos concessionários com esta dinâmica comercial maior temos 55% para a oficina e 45% na venda externa.
O clube de peças ainda está ativo?
O Clube Privilégio já não está ativo. A venda externa de peças vai sempre acontecer, mas o conceito do Clube Privilégio já não seria adequado atualmente. Os nossos investimentos de marketing e comunicação estão cada vez mais canalizados para o conceito interno, para a retenção de clientes. Atualmente temos um portfolio maior de marcas, um desafio de qualidade e adequação do serviço à tipologia de clientes atuais. Hoje, conseguimos suportar a nossa rede de concessionários com o conceito de marketing preditivo, antecipando as necessidades do cliente.
A dinamização das peças é facilitada pelos operadores que se dedicam ativamente a essa venda de peças…
Toda a nossa rede tem a mesma possibilidade de fazer negócio, com condições comerciais exatamente iguais. A questão de localização geográfica com potencial, o grupo onde esses concessionários estão ter ou não ter o investimento que permita essa dinamização, é que os vai fazer parar, ou não, a um conjunto de parceiros.
Relativamente ao digital, toda a informação técnica está concentrada na plataforma MOPAR TECHNICAL INFORMATION. É apenas para as oficinas da rede?
Não, pode ser adquirido um período de utilização para qualquer profissional ou particular. Outro aspeto relativo ao digital e que importa destacar tem que ver com a evolução que existiu, no sentido de tornar o procedimento de receção mais eficaz. Atualmente temos todos os rececionistas equipados com um tablet, e neste processo o rececionista consegue, no momento do diagnóstico, fazer estimativas de custos, propor produtos MOPAR VEHICLE PROTECTION e permite ao cliente fazer a assinatura digital no tablet. Isto, do ponto de vista da relação com o cliente, é um progresso importante, porque permite relacionar a informação, é o princípio do marketing preditivo. A última funcionalidade que lançámos foi a parte de frotas, a Mopar Connect Fleet, um conjunto de serviços do setor automóvel dedicados à gestão de frotas e à segurança dos veículos FCA, para gestores de frota de pequenas e médias empresas, e representa um desafio em termos de divulgação e de demonstração. E a parte da utilização individual está também a dar os primeiros passos. O número de unidades vendidas vai permitir-nos agora retirar as primeiras conclusões. Começámos com o conceito UConnect e hoje, em 24% dos veículos vendidos nos últimos quatro anos, os clientes utilizam-no. Ou seja, conseguimos fazer com que a tecnologia esteja ao serviço do cliente. A ida à oficina para fazer a manutenção e a utilização do veículo de substituição é o momento ideal para o cliente experimentar um veículo equipado com este serviço.
Existe alguma recomendação em termos de lubrificantes dentro da rede?
Sim. O nosso parceiro de lubrificantes é a marca Selenia, através da Petronas. Toda a rede tem a possibilidade de consumir e vender Selenia. Os nossos livros de manutenção dos veículos apontam para normas Selenia e nos novos modelos é o óleo de primeiro enchimento. A nossa comunicação é sempre para Selenia.
Alguns grupos têm vindo a adotar estratégias de redes e marcas de peças próprias para o multimarca. A FCA não foi por esse caminho…
A MOPAR tem como função trazer uma experiência positiva ao cliente nas marcas FCA. A grande prioridade da nossa rede em relação ao pós-venda é incrementar a retenção nas nossas marcas. Para ter uma abordagem de negócio a pensar em multimarca, precisamos de ter outro princípio de gestão.
Mas não preciso ter uma rede não oficial para reter o cliente. Se tiver uma oferta de serviço e preço que vá acompanhando a idade do veículo, sou um fornecedor global para esse mesmo cliente, até que ele decida trocar de carro por outro, dentro das marcas do grupo. É essa experiência é que tem de ser positiva. Não encaramos que nesta fase do negócio que tenha de haver uma MOPAR diferente, para encarar outros períodos de idade dos veículos ou clientes de outras marcas.
É disponibilizada formação dentro da rede?
Sim, temos investido muito nessa área. O acompanhamento contínuo dos nossos recursos humanos e a facilidade que procuramos dar de formações online, para nós é uma preocupação.
Temos um desafio de crescimento, e os desafios da retenção passam também pelo incremento das equipas em muitas das concessões, e estes recursos humanos têm de estar qualificados, em termos de componente técnica e comportamental.
Perfil
Nuno Lopes está ligado ao pós-venda automóvel há 25 anos. Depois de seis anos na SIVA, passou para a FIAT, no ano 2000. Manteve-se no Grupo FCA até hoje, tendo assumido a posição de responsável de pós-venda em abril de 2012.
Perguntas rápidas
Qual foi o seu primeiro carro?
Foi um Opel Astra.
Quantos quilómetros faz por ano?
Faço cerca de 35 a 40 mil quilómetros.
O que mais gosta neste setor?
A relação com o cliente e o perceber de que forma posso dar uma boa experiência aos clientes.
E o que menos gosta?
O ter de acabar com o estereótipo que as marcas são caras.
Considera importante visitar as oficinas?
Mais do que isso, se possível, devemos ter também a experiência como cliente, fazer todo o caminho para avaliar o serviço.
O que faz nos tempos livres?
Gosto de todo-o-terreno.
Artigo publicado na Revista Pós-Venda Pesados n.º 41, de fevereiro de 2019. Consulte aqui a edição.